domingo, 10 de junho de 2012

Panem et Circenses ou da Angústia



Recomenda-se amiúde e com obstinação o otimismo; preconiza-se de modo insano a alegria. A única pergunta cabível nesta oportunidade seria: Em que circunstâncias? Parece-me que tal recomendação não só tem origem, como também se dirige àqueles cuja vida se resume a pão e circo. Estruturas sociais são disponibilizadas para facultar Questa bella vita. Então a vida discorre - pelo menos na visão deste pragmatismo forjado - ou escorre tranquila e macia em um onírico clima de banalidade, onde todos os problemas são irrelevantes, as dificuldades são aparências e, portanto, igualmente irrisórias.
Neste caso, a arte mesma perde todo seu significado, pois que esta vem servir-nos de alento frente às dificuldades que se nos impõe. No entanto, caíram por terra o entusiasmo e a inspiração. O comedimento esvaiu-se, o excesso insurgiu-se.
Bem, como este texto-desabafo e não trânsfuga não pretende versar sobre imposturas de uma autoajuda, então, se me permitem, gostaria de falar um pouco sobre angústia. Sim, a angústia que se me afronta quando ouço as tolas recomendações, quando testemunho os sorrisos vagos de seres apascentados, quando constato a peregrina vulgaridade. Torno-me presa de intensa aflição ao perceber a arte amesquinhar-se, promiscuir-se, desconstruir-se; e tudo em nome de uma ruptura conceitual necessária e indolente. Tudo desemboca no leviano, no sofrível, na degenerescência. Mas o que ainda mais me apavora é o fato de não mais ser surpreendido.
Acredito que grande parte das pessoas desconhece o que seja sentir-se inútil. Como a ignorância torna os seres humanos felizes! Como o banal oblitera o raciocínio e obsta a sensibilidade humana! Em verdade eu os invejo. O quanto eu gostaria de assimilar o inútil, o torpe, o obsceno, o infame,... Mas é tarde. Fiz oferendas à Minerva; a Apolo ofereci libações de sangue; meu repasto está em Sofia. Então se justifica meu desespero e meu clamor. Angústia é isso: é o viver uma vida que se revela ácida, estreita, agônica em toda a sua extensão. O desespero é despertar e perceber que se vive, muita embora não se possa chamar viver o que há muito descaracterizou-se como vida.    

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Da obviedade do óbvio


  
“Quando você perceber que, para produzir, precisa obter autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em auto sacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada”.                                                          
                                                                                                                     Ayn Rand

De início, minha intenção fora comentar as declarações da filósofa russo-americana, mas... Comentar o que? Parece que nada há para comentar diante do óbvio. A obviedade cala-nos. Não é um calar advindo do temor; não! Tampouco um calar que se funda na insipiência. É somente um calar originado no constrangimento; constrangimento de saber-nos falhos, cúmplices. O emudecimento não é uma reação, mas a convicção de nossa vil, parca e insossa participação na sociedade. Criamos uma estrutura social maquiada pela comodidade; inventamos padrões de comportamento com promessa de felicidade, permitindo que interesses outros nos tornem cegos, broncos e gananciosos.
Então deparamo-nos com os que pensam e lançam, malgrado nossa vontade, uma gradativa e carrasca verdade. Nosso egoísmo é tanto que negamo-nos a enxergá-lo, bem como a sua gênese; nosso egoísmo é cultivado e alia-se à vaidade. E o que pode se opor a esse egoísmo? Não o altruísmo, mas aquilo que de fato é: o óbvio. O óbvio, nesse caso, tem por fito mostrar nossa pequenez e indiferença ante aquilo que mais “prezamos”: a vida em sociedade. Benvinda seja, portanto, a obviedade!