terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Uma nova Gotham City


Acredito que o termo Gotham, antes um substantivo próprio, designante de uma cidade, esta por sua vez fruto da criação, uma abstração portanto, tenha se transformado em conceito. Gotham City, a princípio, seria uma cidade envolta em trevas (e aqui o termo trevas pode ser entendido de modo abrangente), habitada por um sem número de marginais, repleta de punguistas e desocupados. Fato curioso é que dentre a marginalidade típica de Gotham, emergem sempre “líderes” que se valem de recursos os mais sofisticados, inclusive tecnológicos, para realizarem seus intentos.
A autoridade policial - em Gotham, evidentemente - mostra-se amiúde incapaz, pois não desfruta dos mesmos requintados aparatos de que se valem os transgressores. Então, em face da impotência desta ineficaz e ruidosa autoridade, surge o herói: destemido, acusador, litigante. Mas este herói mostra-se sempre mascarado (a máscara aqui pode ser amplamente interpretada); por trás deste herói há um homem de sociedade, igualmente “sociabilizado”, e, por conseguinte, eivado de torpezas e recursos. Não é uma heroicidade espontânea, standard, original, surgida como algo arrebatador; é um heroísmo construído, moldado, forjado, esculpido, trajado de um altruísmo casuísta. E justamente por ser casuísta, este herói, em bem pouco tempo, perde seu valor, entorpece suas proezas e decepciona, originando a indiferença e a revolta em seus antigos tutelados hipossuficientes. Antigos heróis cedem lugar a outros; por mais que se queira descartá-los, nós ainda por eles instamos. Este foi o legado do grego Homero e de outras civilizações: heróis nos servem de esteio, de leimotiv. E na falta de verdadeiros heróis, tornamo-nos amoucos mesmo de qualquer arremedo.
Nosso país em muito se assemelha a Gotham, seja no aspecto social, seja na estrutura organizacional, seja nas circunstâncias políticas. Gotham agora se nos revela como síndrome. Heróis, ou melhor, arremedos de heróis abundam nossa história desde os primórdios da nação, surgidos eles do esporte, do executivo ou do legislativo. E o que temos agora? Uma nova classe de heróis: heróis de toga negra - trajes semelhantes ao do herói morcego de Gotham - que surgem como vestais e propõem extirpar o câncer disseminado pelos heróis de ontem. Preocupa-me não o fato de serem novos os heróis, mas sim o alto preço que se deve pagar para resgatar a credibilidade do sistema judiciário. E como em resposta ao surgimento desta nova classe, vincula-se-nos a malfadada esperança, o que nos torna condescendentes e rotos reféns, simplesmente, de uma inexplicável, imponderável e ignota fé. Louvemos, então, a nova classe heroicizada. Não obstante, contrariando o legado homérico, podemos afirmar: “Triste da nação que precisa de heróis”!  

Um comentário:

  1. Tenho um questionamento meu amigo. Qual razão de nosso país melhorar seus indicadores de distribuição de renda e educação (claro que estamos longe do ideal, mas segundo as agências nacionais e internacionais evoluímos nesses aspectos) e a violência ter aumentado de forma esponencial?
    Essa é uma questão que me intriga, pois cresci com o argumento de que a violência no Brasil era fruto da ignorância e da má distribuição de nossas riquezas.

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