quinta-feira, 16 de maio de 2013

Dos sabores ou da juventude



Confesso que a temática em questão deveria pautar-se, também, em ampla pesquisa de opinião. No entanto, minha breve experiência como pesquisador foi fracassada, pois as pessoas com as quais abordei o assunto mostraram-se insipientes, lacônicas ou algo que o valha. Certifiquei-me, portanto, da minha falta de inclinação natural para pesquisas in loco. Todavia, permito-me discorrer sobre o assunto, embora ciente das celeumas que daí possa advir. Refugio-me, por conseguinte, na despretensiosa certeza de que o texto a seguir não se arvora em status de artigo científico.
Bem, mas atenhamo-nos aos sabores. Não sei se por conta da idade, ou por conta das aleivosias características da própria idade, comecei a perceber certo dissabor nos sabores. Algumas frutas – e não poucas – revelam-se-me como aguadas ou, se preferirem, insípidas; alimentos outros mostram-se-me como enjoativos, repugnantes mesmo. Alguns odores, típicos de certos alimentos, agora me parecem nauseabundos. 
Então, tem início minhas lucubrações especulativas no intento único de justificar meu desapego às opções alimentares. Seria o desgaste dos solos? Seriam os processos de fertilização, exatamente para minimizar tal fenômeno? Seriam as experiências transgênicas? Seria o empobrecimento do sentido do paladar? Seria a degeneração dos sentidos em função de uma depauperação orgânica? Não seria uma disfunção secundária em virtude da percepção acurada da insipidez da própria existência? Não seria uma espécie de ageusia - a perda da capacidade de sentir paladar - isto é, um tipo de afasia dos sabores?
 Subitamente me chega à imagem dos temperos, dos molhos, enfim, dos produtos que exaltam sabores. Ora, se tais existem, é porque os alimentos em si requerem um complemento. E, não casualmente, recordo que nos dias de hoje há uma intensa oferta dessas ferramentas complementares ao sabor. Parece-me, então, que minha observação não é de modo algum desprovida de fundamento. Contudo, na juventude, pelo menos em minha juventude, os alimentos me pareciam mais saborosos, suculentos, deleitosos. Será que a juventude desfruta de sabores (paladares) que o tempo se encarrega de degenerar? Será que a consciência do vivido torna também desagradável paladares, aromas, sensações? Nesse caso, faz-se mister o recurso dos molhos, dos temperos.
Não obstante, observo a mocidade. Precisariam, de fato, de tais recursos visando o apuro do olfato e paladar? Se a emasculação dos sentidos vem com a idade, por que tais recursos em período tão lúdico, tão ingênuo? Por que a precocidade? Estariam os jovens desenvolvendo uma precoce precocidade, justamente porque o vivido se lhes corrompe e aliena? Por que os jovens, esses holders of flavors - detentores de sabores - estão, cada vez mais, fazendo uso de recursos espúrios na alimentação? Estaria o termo ingenuidade fadado ao ostracismo?
A resposta a todo este questionamento funde-se, assim me parece, depois destas breves conjecturas, a uma única sentença: Mesmo se levando em conta a exaustão do solo, os experimentos para recuperá-lo, os testes transgênicos, o envelhecimento orgânico e tudo o mais, há que se ter em mente a dilapidação dos valores, dos preceitos, das relações, que, de certo modo, influenciam negativamente no vivido, tornando o desfrutar da vida em si como desprazer. O prazer do alimento, que se manifesta como complemento/fundamento ao prazer de viver, parece-me deteriorado. Mas o que me causa espécie e preocupa é o fato de que a juventude pode estar sendo arrebatada de sua paladaricidade.  

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