Confesso que a temática em
questão deveria pautar-se, também, em ampla pesquisa de opinião. No entanto, minha
breve experiência como pesquisador foi fracassada, pois as pessoas com as quais
abordei o assunto mostraram-se insipientes, lacônicas ou algo que o valha.
Certifiquei-me, portanto, da minha falta de inclinação natural para pesquisas in loco. Todavia, permito-me discorrer
sobre o assunto, embora ciente das celeumas que daí possa advir. Refugio-me,
por conseguinte, na despretensiosa certeza de que o texto a seguir não se
arvora em status de artigo científico.
Bem, mas atenhamo-nos aos
sabores. Não sei se por conta da idade, ou por conta das aleivosias
características da própria idade, comecei a perceber certo dissabor nos
sabores. Algumas frutas – e não poucas – revelam-se-me como aguadas ou, se
preferirem, insípidas; alimentos outros mostram-se-me como enjoativos,
repugnantes mesmo. Alguns odores, típicos de certos alimentos, agora me parecem
nauseabundos.
Então, tem início minhas
lucubrações especulativas no intento único de justificar meu desapego às opções
alimentares. Seria o desgaste dos solos? Seriam os processos de fertilização,
exatamente para minimizar tal fenômeno? Seriam as experiências transgênicas?
Seria o empobrecimento do sentido do paladar? Seria a degeneração dos sentidos
em função de uma depauperação orgânica? Não seria uma disfunção secundária em
virtude da percepção acurada da insipidez da própria existência? Não seria uma
espécie de ageusia - a perda da capacidade de sentir paladar - isto é, um tipo
de afasia dos sabores?
Subitamente me chega à imagem dos temperos,
dos molhos, enfim, dos produtos que exaltam sabores. Ora, se tais existem, é
porque os alimentos em si requerem um complemento. E, não casualmente, recordo
que nos dias de hoje há uma intensa oferta dessas ferramentas complementares ao
sabor. Parece-me, então, que minha observação não é de modo algum desprovida de
fundamento. Contudo, na juventude, pelo menos em minha juventude, os alimentos
me pareciam mais saborosos, suculentos, deleitosos. Será que a juventude
desfruta de sabores (paladares) que o tempo se encarrega de degenerar? Será que
a consciência do vivido torna também desagradável paladares, aromas, sensações?
Nesse caso, faz-se mister o recurso dos molhos, dos temperos.
Não obstante, observo a
mocidade. Precisariam, de fato, de tais recursos visando o apuro do olfato e
paladar? Se a emasculação dos sentidos vem com a idade, por que tais recursos
em período tão lúdico, tão ingênuo? Por que a precocidade? Estariam os jovens
desenvolvendo uma precoce precocidade, justamente porque o vivido se lhes
corrompe e aliena? Por que os jovens, esses holders
of flavors - detentores de sabores - estão, cada vez mais, fazendo uso de
recursos espúrios na alimentação? Estaria o termo ingenuidade fadado ao
ostracismo?
A resposta a todo este questionamento
funde-se, assim me parece, depois destas breves conjecturas, a uma única
sentença: Mesmo se levando em conta a exaustão do solo, os experimentos para
recuperá-lo, os testes transgênicos, o envelhecimento orgânico e tudo o mais,
há que se ter em mente a dilapidação dos valores, dos preceitos, das relações,
que, de certo modo, influenciam negativamente no vivido, tornando o desfrutar
da vida em si como desprazer. O prazer do alimento, que se manifesta como
complemento/fundamento ao prazer de viver, parece-me deteriorado. Mas o que me
causa espécie e preocupa é o fato de que a juventude pode estar sendo
arrebatada de sua paladaricidade.
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