quinta-feira, 25 de julho de 2013

O cão, o pássaro e o Bonsai.


Ainda ontem, em lugar de me deleitar com os torpes pensamentos que teimam em se me apresentar quando em condições de insulamento, propus-me conjecturas acerca do próprio estar só. Então a pergunta: é possível um estar totalmente só? Afinal, até mesmo o grande Zaratrusta, segundo Nietzsche, em sua caverna isolada sita na Vaca Pintalgada, fazia-se acompanhar de uma águia e uma serpente. O único eremita da história, pelo que me consta, a vivenciar total isolamento foi Platão ao fundar sua República. Ora, a República foi o eremitério platônico. Mas Platão é outra coisa, outro nível; repudiou a arte e a vida no interior escuro da caverna para sair em busca do mundo das ideias. Platão, pelo que pude perceber, era um edipiano, cheio de vontades e ademanes.

Com exceção de Platão, claro, parece-me que o estar totalmente só, encarcerado unicamente no pensar, é prejudicial, contraproducente e alienador. Seres humanos precisam de companhia, do referencial de imagens, do perceber os sons. Imagens e sons são personagens de um teatro natural; imagens e sons naturais impõem-se à artificialidade. No Gênesis 2:18, o autor, ao citar as palavras de um criador, declara: “Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma adjutora que esteja como diante dele”. Bem, aqui me permito uma exegese apócrifa: uma adjutora não seria necessariamente uma mulher. Adjutora pode ser entendida como coadjutora, ou seja, pessoa que ajuda, alguém que desempenhe papel coadjuvante. Ora, entender a mulher como coadjutora, seria colocar outro ser humano em posição subalterna. Não! A natureza em si seria a coadjutoria necessária e eficaz. A não ser que lancemos mão de uma metáfora sobremodo romântica: Natureza, teu nome é mulher! 

De modo semelhante, o não estar só não implica necessariamente a presença da família ou o incorporar do estereótipo de um ser social, isto é, o vínculo a uma sociedade e/ou comunidade. Por que pessoas, em geral idosas, partilham suas vidas com cães e/ou gatos? Simples, o companheirismo. Por que alguns dedicam parte da vida às plantas, ao cultivo de flores, a manutenção de jardins? Igualmente simples! O imagético conforta. Por que a criação de canários ou aves canoras? Ora, os sons naturais promovem conforto, alacridade, satisfação, o prazer inefável. Na verdade, um retorno à condição primeira: a natureza rústica e invulgar. Eis os adjutores criados para impedir que o homem esteja só!

Não obstante, há uma casta de fundamentalistas que obstaculizam a criação de aves em cativeiro; outro grupo defensor de “os direitos dos animais” modelou um código de leis a ser observado pelos potenciais criadores de animais domésticos; há ainda aqueles que se dizem defensores do meio ambiente e estabelecem regras para o cultivo de algumas espécies, dizendo tratar-se de exemplares que requerem cuidados especiais para não se extinguirem. Tudo isso é muito é belo e pertinente, mas é bom lembrar que o melhor modo de se disseminar a mentira é ter-se como premissa maior uma verdade. Eu, apaixonado que sou por conspirações, e defensor da tese foucaultiana de que existem grandes diferenças entre assertivas e asserções, pergunto: Por que esses paladinos, defensores empedernidos da natureza, militantes dos “direitos naturais” não se voltam, entre tantas aberrações, a propor o fim das ricas e famosas Festas dos Peões de Boiadeiros, mesmo que seja uma tradição cultural? Por que acochar os testículos dos touros com nós de corda crua para que estes proporcionem um espetáculo de barbárie a uma massa igualmente bestial? Simples: interesses econômicos sobrepujam discursos sofísticos; movimentos em prol do fim de certas tradições semelhantes aos circos romanos não conferem a ninguém o manto da celebridade!

Bem aventurados aqueles que dispõem da companhia dos animais, que desfrutam do canto de algum pássaro e se encantam com a visão silente dos vegetais, mesmo em se tratando de minúsculo Bonsai. 

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