Dizem as más línguas (ou seriam as
boas?) que tudo na vida é cíclico. Atualmente, em face de uma estranha
pandemia, somos obrigados a nos valer de máscaras. Curioso é que não só as
pandemias, mas também o uso de máscaras atendem e justificam esta asserção
profética. Sim, seres humanos, assim me parece, adoram este atavio: as máscaras,
não as pandemias. Historiadores, os mais renomados (perdoai-me, mas neste
momento não me recordo de nenhum exemplar), já se dedicaram ao estudo do surgimento
e uso das máscaras.
E tudo, ou quase tudo, (ou quase
nada?) teve início na antiga Grécia: máscaras e pandemia. Na Hélade, em as
festividades dedicadas a Dioniso, o povo usava máscara, pois cria que o próprio
deus estaria presente dentre eles. Percebei: as pessoas faziam uso do tal
petrecho para evitarem ser vistas e/ou reconhecidas pelo deus homenageado. Bem,
aqui, do alto da minha escassa intelectualidade, sou levado a declarar, por inferência,
que as pessoas evitam a aproximação com deuses. Por que será? Complexo?
Escrúpulos? Preconceitos? E, consequentemente, sou levado a crer que homenagens
são meros recursos para o entretenimento. Homenagens apenas retratam o alto
grau da hipocrisia; homenageados experimentam o limiar da vaidade.
No Japão, no teatro kabuki, a máscara
expressa o estado de espírito dos personagens. Opa, calma! O que estou a dizer?
Máscara de um personagem? A personagem, em si, já pressupõe o uso de máscaras.
Sim, a persona, por onde sai o som. Com que então, o personagem nipônico, além
de ser máscara, precisa de máscara? Personagem complicado! direi, pois. E os
atores? Se há necessidade de máscaras para os atores expressarem sentimentos, então estes não seriam
bons atores. Não, não nos façamos críticos de arte!
Nas culturas primitivas, existentes
nos continentes africanos, americanos e até mesmo em algumas ilhas do Pacífico
Sul, as máscaras são usadas em cerimônias religiosas. Neste momento, reclamo
vossa atenção: por que o elo entre máscara e religião? Segundo os antropólogos,
os anciãos das tribos fazem uso do adorno visando a cura de alguns, espantar
maus espíritos, etc. Pergunto-vos: Por que estes avatares ainda não foram
requisitados? Algumas pessoas estabeleceram certa semelhança entre o
curandeirismo e o uso da hidroxicloroquina. Seres humanos, ditos racionais,
preferem, por certo, ouvir o aconselhamento daqueles que têm por objetivo último
o reconhecimento, as homenagens.
No Halloween, o uso de máscaras é
imprescindível. E o que dizer do carnaval brasileiro? Carnaval que se preza,
não abre mão do uso de máscaras. Sim, eu sei que o Entrudo está ultrapassado;
meu carnaval é das antigas, é raiz. Trata-se de vintage culture e sabe-se mais
lá o quê. Mas ... quem resistiria ao charme de uma bela colombina? Quereis
paixão melhor retratada do que num semblante de Pierrot? Ou seria pierrô? Sim,
eu falo em paixão, coisa para poucos dias, relacionamento com prazo de
validade.
Mas ... e as máscaras? Elas, de fato, auxiliam
na cura? Afinal, jamais estivemos sem elas; na sociedade, nunca ousamos delas
prescindir; nossa existência é por elas aparelhada. Eu as enumerei, mesmo que
superficialmente e distante de qualquer critério. Diferentemente da sabedoria
popular, onde “o mais gostoso fica para o final”, deixo-vos às voltas com o
pior tipo de máscara: aquela que não se mostra como artefato; aquela que só é
detectada com a convivência. Ao contrário do teatro Kabuki, a persona, o personagem,
apesar de implicar máscara, autodeclara-se puro, íntegro, transparente. Enfim,
independente de quaisquer pandemias, recidivas ou não, as pessoas inventam
pseudo máscaras, ou não máscaras, para mascararem o que não conseguem esconder de si mesmas.
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