domingo, 11 de agosto de 2019

Hodierno



Este, na verdade, é um desabafo, fruto da patente dificuldade nas relações no mundo atual. As pessoas, em sua maioria, entopem-se de informações superficiais, tendenciosas e igualmente inócuas, e são incapazes de filtrar tais notícias; elas simplesmente as repassam sem qualquer critério, pois lhes falta o mínimo de criticidade. Não há mais diálogo; há apenas empenho por parte de muitos em transmitir e defender ideias ou opiniões que lhes são de todo estranhas. O processo de emburrecimento parece-me, portanto, irreversível. Há um surto não endêmico – arrisco-me a falar em epidemia – de bloqueio cognitivo. As pessoas dão a entender que se negam a pensar; o dia-a-dia oferecido lhes basta, o que é sugerido é bem-vindo, o que é apresentado torna-se verdadeiro.

Paralelamente vemos emergir uma espécie de culto à agressão. Já percebestes que existe uma agressão no falar e nas próprias relações cotidianas? Há agressão no vestir, no trajar, no embelezar. A estética mostrou-se permissiva com a agressividade. Corteja-se de modo agressivo; ama-se de modo agressivo. As notícias são pura agressividade. A arte contemporânea prima pela injúria, insulto, ataque. A literatura é agressiva, as artes plásticas são impetuosas e desagradáveis porque violentas, o cinema e o teatro agridem, a música e a dança são agressivas. A poesia tem por base a agressão.

Vez por outra aparece alguém dizendo-se disposto a arrefecer e modificar semelhante condição. Mas, qual nada... Pautado em sua própria insipiência, falta de sensatez e patente ignorância, lança mão de incauta sutileza para revelar um cinismo imoderado. Apela para o motejo, para o gracejar; e vem a ironia, a troça, a zombaria, o escarnecer. Enfim, o que se tem é sarcasmo acerca de algo ou tema que, em si, permanece ignorado.

Pergunto-vos: Como é possível a convivência?

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