sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

A Serpente e o Logos



“No princípio era o Logos, e o Logos estava com Deus, e o Logos era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez.” João 1: 1-3. Em geral, as pessoas entendem o termo Logos como palavra, como fala ou coisa assim. O termo grego, no entanto, é polissêmico, pois admite 18 acepções ligadas à raiz do verbo “legein” - trazer à luz. Eis algumas delas: dizer, palavra, discussão, proposição, definição, frase, declaração, razão (argumento), Razão (faculdade de raciocinar), proporção (associado à tradição pitagórica, pois a primeira fração apresentaria o mesmo “Logos” que a segunda fração), explicação, mensagem (em sentido metafórico), manifestação, conclusão, criação advinda de ideia, expressão. Pelas palavras de João, podemos perceber que o Logos implica diretamente manifestação, uma criação advinda de ideia formal, expressão de algo antes interiorizado, apenas pensado e com necessidade de ser exteriorizado; algo que exige sua formalização, sua materialização.

Em face do até aqui exposto, pode-se inferir que a formalização, exteriorização, materialização exige, em si, sua expressão, sua divulgação e conhecimento. Aí, portanto, entende-se o vínculo do Logos com a palavra, com a linguagem, a definição. E como surge a linguagem? A linguagem teve três momentos distintos: de início tivemos uma língua concebida por hieróglifos, a linguagem utilizada pelos deuses, uma linguagem muda, gestual; em segundo momento tivemos a língua simbólica, a linguagem dos heróis, na qual os símbolos tiveram primazia; por último tivemos a língua articulada, linguagem dos seres humanos, linguagem poética, com versos jâmbicos (uma sílaba breve e outra longa), cuja constituição teve início com interjeições, depois pronomes, em seguida as preposições, então os nomes e por fim os verbos. Contudo, ainda mantemos, e até por carência da própria linguagem articulada, o uso das metáforas, esta herança da fase simbólica. 

Bem, o objetivo da linguagem é tornar possível a comunicação, o conhecimento. No Antigo Testamento, o símbolo era a árvore do conhecimento do Bem e do Mal. É pertinente chamar a atenção que a primeira musa, advinda dos raios de Júpiter, foi definida por Homero como a “Ciência do bem e do Mal”. E como o ser humano inicia a “degustação” do fruto desta árvore? A tentação da serpente! Mas por que serpente? Sim, a serpente de que fala o Antigo Testamento é simbologia pura e ligada à Píton, serpente vencida por Apolo. As primeiras expressões dos seres humanos tiveram origem na presença da Píton, pois ela originou a linguagem articulada, ou seja, as interjeições provocadas pelo espanto. Não só a filosofia nasce com o espanto, mas também a linguagem articulada. Talvez esteja aí o estreito vínculo entre espanto, filosofia e Logos. E evidentemente, tudo graças a bondosa serpente!

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