quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Brot-gelehrte



Algumas pessoas, as mais próximas, evidentemente, perguntam-me porque leio e escrevo tanto; porque insisto em publicar meus textos, apesar da patente não aceitação dos mesmos; porque essa dedicação em transmitir aos outros - a grande maioria, senão a quase totalidade - o que não lhes é do menor interesse. Bem, diante de semelhante inquisição eu busco sorrir, mas... A leitura é um vício, algo como o tabagismo ou alcoolismo. A vontade de escrever advém da vontade de partilhar com alguém os conteúdos assimilados nos livros. Quanto à divulgação, muito embora o faça somente através de um blog - e com pseudônimo, porque não pretendo tornar-me celebridade - soa-me como um dever. Alguém como eu, que foi professor, que tinha prazer em preparar aulas, selecionar textos, lê-los e explicá-los a cada aluno se necessário fosse, não pode se convencer que o conhecimento é propriedade sua, que lhe seja algo particular, de íntimo desfrute, como se o conhecimento fosse uma coleção de selos ou algo assim. Não, o professor, o vero dáskalos, aquele que zela de modo consciente pelo seu papel junto à sociedade, não se limita a comparecer às instituições e despejar conteúdos sem o mínimo critério. O lente deve obrigar-se a fazer com que os conteúdos por ele ministrados sejam assimilados, apreendidos. Será que os professores, as pessoas detentoras de expressivo nível cultural conseguem compreender esta enorme responsabilidade? Então, se me revisto de tal responsabilidade, é óbvio que cobro a mesma seriedade e responsabilidade dos alunos. Ah, quantas vezes fui agredido, insultado, vilipendiado! Pasmai, os colegas, também professores, aconselhavam-me a ser mais “flexível”. Não foram poucas as ocasiões em que ouvi frases do tipo: “Eu cumpro com minhas obrigações: ministro as aulas; acompanhem-nas quem quiser”. Ou então: “Não estou aqui para me indispor com aluno; não os reprovo, pois o mercado de trabalho irá fazer a seleção”. Esquecem-se estes que cabe ao professor separar o joio do trigo. 
  
Aqui, mais uma vez, exponho-me a receber um sem número de adjetivos, alcunhas, insinuações, bem como tornar-me alvo de chacota, pois entendo que nós, professores, muito embora o sistema educacional mostre-se cada vez mais medíocre e “adoentado”, devemos ter em mente que o conhecimento e a cultura nos diferenciam dos demais membros da sociedade, não porque somos melhores que eles, mas porque temos que cuidar da formação desta sociedade, a zelar pelos seus membros, nossos iguais, tornando-os melhores cultural e moralmente. Ainda pautado na didática, e na tentativa de embasar meus argumentos, faço uso de um recurso banal: a exemplificação. 
  
Em sua aula inaugural, na Universidade de Jena, em 1789, Friedrich Schiller não poupou críticas ao que ele chamou de Brot-gelehrte, ou seja, o educador que faz da ciência apenas um ganha-pão e da universidade uma escola profissionalizante. Brot significa pão. Contudo, o conceito de gelehrte abriga bem mais que o explicitado, - erudito, culto - pois reporta-se àqueles que visam o sumo bem da humanidade, aos que buscam melhorar a espécie, tornando-a nobre. Estes não objetivam apenas a transmissão de conhecimentos, mas também, nas palavras de Fichte, “à formação do coração para a virtude, formação para o interesse prático na busca pela verdade”. Ora, se o educador trabalha pelo enobrecimento da espécie humana, ele deve mostrar-se e portar-se como cidadão exemplar, isto é, alguém igualmente nobre - von edel Mensch.

A propósito: esta aula foi ministrada tão somente pelo prazer de servir à sociedade!

Um comentário:

  1. Ao ler este texto me deu um certo gás...
    me proporcionou uma autoestima além do ego. Gerando o aquecimento de minha vontade em ser professor que estava esfriando.
    Obrigado.

    ResponderExcluir