quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Nihil nisi verba


Grande número de pessoas está a dizer que meus escritos são elitistas... Não, não escrevo para eruditos, assim como não tenho intenção de dirigir-me aos néscios. Busco apenas aprimorar-me no modo escorreito, pois que admiro sobremodo a língua portuguesa. Reduzida parcela de circunstantes, todavia, acusa-me de “purista”, o que prefiro entender como elogio. Infelizmente, para todos nós, independentemente se letrados, sábios ou ineptos, nosso idioma vem sendo mutilado, vilipendiado. Pessoas de diferentes classes sociais e graças a uma espécie de doutrina, - estúpido modismo - introduzem termos estrangeiros totalmente fora de contexto em nossas orações coloquiais. Não falo de estrangeirismos, de corruptelas ou dos neologismos adquiridos em face da convivência com demais povos, mas tal expediente - essa salada idiomática - agride e banaliza nossa raiz cultural. Volto a declarar, como já o fiz em outras oportunidades, que divirjo daqueles que anunciam “só ser possível filosofar em alemão”; discordo também dos que entendem o português como “língua periférica”. Antes de tudo, salvo melhor juízo, consigo perceber certo empenho, por parte de alguns, em tornar nosso idioma periférico. Línguas outras, mais faladas do que a nossa, nesta Babel globalizada, mostram-se limitadas e com restrição vocabular. Penso que, excetuando-se o idioma espanhol, a língua portuguesa revela beleza ímpar, haja vista as nuanças harmoniosas que expressam vigor; há um quê de melódico e aprazível em nossa mater lingua que denota, além do mais, muita sensibilidade. Nossa linguagem é tão densa que vem permitir confecções de textos como se outro idioma fosse. Segue-se, portanto, o exemplo abaixo:

 

Nada além de palavras  

O abadengo pudibundo, em virtude de insalubres escarmentos, assemelhava-se à vegetal xerófilo; poder-se-ia dizê-lo um escaganifobético. Todavia, aspirava em ser jocoso, iracundo talvez. Quisera lançar impropérios, verter turpilóquios, ser tosco... Mas sua educação distava; valores outros lhe tinham sido pespegados, fora criado melindroso. Nas conversas mostrava-se encomiástico, esbanjava circunlóquios, perífrases. No âmago, contudo, sabia-se além de restrito, exaustante. Possíveis dialogantes, com brevidade de tempo, revelavam-se lacunares e modorrentos. À pudicícia somava-se a timidez. Contudo, buscou apropinquar-se de certa donzela, que além de pulcra, esbalgia pansofia. Reconheceu-se amantético e lobrigara oportunidade em fazer a corte. A pucela, no entanto, viu-se presa de jogo temerário, e a ressumar pavor armou-se de objeto perfuro-cortante. Enfim, o envergonhado anacoreta fenecera vitimado pelo que mais pregara: o amor!

 

PS: Em havendo dificuldades na compreensão, recomendo-vos o dicionário. 


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