segunda-feira, 23 de março de 2020

The sound of silence



Quarentena! Não, não falemos do vírus, mas das consequências. Boas? Difícil mensurar. Depende das consequências, ou seja, dos resultados naturais de um fato qualquer. Então nos perguntamos pelo bom resultado. Mas a quarentena não é consequência; é recurso para minimizar sobremodo a possibilidade de infecção; é prevenção. Então, ela mesma deve trazer bons resultados. Contudo, identifico epifenômenos. Vejamos!

 A casa tem sido alvo de faxinas e arrumações intermináveis. Minha biblioteca toda organizada, livros catalogados. A coleção de selos, enfim, atualizada. Papéis velhos foram descartados, alijados. Meus armários passaram por uma devassa: quanta roupa encostada, quantos calçados em abandono...  eu, a me considerar incapaz na ajuda aos necessitados. E o mais intrigante em tudo isso é o silêncio em que estamos mergulhados. Não, o silêncio não atordoa. Creio que, apenas, nos desacostumamos com o silêncio. Os ruídos dos motores cessaram; as ruas estão desertas... Muito raramente, a sirene de uma ambulância.

Todavia, não ouço mais conversas. Onde os risos, os gritos, a alacridade infantil? Eis o som do silêncio! Por onde os cães que normalmente rosnam, ganem, latem? Onde o miado desafiante dos gatos que vagabundeiam pelos telhados? Não, durante a quarentena não mais ouvi o cantar de um simples e longínquo galo. E por que não mais recebo a visita dos bem-te-vis, dos sanhaços? Os saguis têm evitado assobiar e zanzar por muros e postes ao cair da tarde. Até os pombos se fizeram ausentes...

Eis o som do silêncio! Mas por que o emudecimento? Tal poder adviria da quarentena ou da possibilidade de contrair a doença? Homens e animais unidos, jungidos num mesmo ideal, num mesmo fim? Arrisco-me: este silêncio é místico! De modo inconsciente a natureza está redescobrindo a solidariedade. Nós, seres humanos, estamos a resgatar nossa humanidade. Neste momento não estamos preocupados com o indivíduo; não desejamos contemplar esse ou aquele ego. Estamos a repensar, a reaver nossa origem. Estamos, enfim, a praticar o amor.  

Here is the sound of silence. You can dance!

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