sexta-feira, 11 de maio de 2012

O gerúndio como solução

Tornei-me um cético em relação ao gerúndio. Parece-me que esta forma verbal invariável passou a ser utilizada como recurso furtivo ao não-fazer, ou seja, é empregado quando alguém diz estar fazendo algo que na realidade ainda não fez, e até mesmo quando não tem muita vontade de fazê-lo.
Confuso? Não. Uma dica: quando alguém se compromete em tomar uma atitude qualquer e sobrevier o arrependimento, basta que, requestado no tocante ao compromisso assumido, retire o “r” final do verbo no infinitivo e acrescente o fatídico “ndo”. A coisa funciona mesmo e a pessoa vê-se livre, pelo menos por um certo período de tempo, dos solicitantes.
E já que falamos em tempo, o gerúndio parece desprezar o tempo. O que é “estar fazendo”? Neste caso a ação implica não só um término, mas também a indefinição deste término. E nós, pragmáticos que somos, perguntamos: mas quando? E a resposta é imediata: - Ah, tenha paciência; estou fazendo!
O assunto é tão sério que, em minha casa, proibi meus filhos de empregarem o gerúndio. Toda vez que os chamava era um tal de: “To indo!” Mas não vinham. Não, não era mentira; talvez indolência, talvez vontade de não atenderem ao meu chamado.
Mas o gerúndio tem uma dimensão preocupante: quando é utilizado para mascarar uma outra ação. Quem poderia, ao se deparar com um adolescente diante de um livro de química, não crer que ele estivesse estudando? E a esposa solícita que chama por telefone o número do escritório do marido e ele responde agastado: - Estou trabalhando! 
Há ações que implicam gerúndio. Vejamos: quando nos chega aos ouvidos o choro de uma criança, não se pode negar que ela esteja, de fato, chorando. Todavia existem outros seres que fingem chorar; lágrimas rolam por faces vermelhas e contritas. Não, eu não falo da arte dramática. Atenção: as mulheres choram, os políticos choram; até o presidente chora.
Mas será que alguém, excluindo-se a dramatúrgica classe, conseguiria falsear um sorriso amplo e contagiante, forjando alegria? O sorriso, este que os senhores, meus incautos leitores, ostentam nos lábios – mesmo que motejador – corresponderia, de fato, à declaração gerúndica: “Estou rindo!”
Doravante, em face de leitores experts em gerúndio, devo lembrar: o analfabetismo, o contraste social e o desemprego no Brasil estão diminuindo; o problema da saúde e da segurança pública estão sendo levados à sério; a classe política está sendo punida em suas aleivosias. No mais, parafraseando Chico, “aqui na terra não só estamos jogando futebol”, mas estamos bebendo e brindando a saúde dos tolos e sambando num eterno carnaval.

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