quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Semáforos

 

A cor vermelha a sugerir o incandescente; é luz, é alerta. E eu passo a frear o veículo de modo lento. Paro e recordo: “Olá, como vai? Eu vou indo e você, tudo bem? Tudo bem...” Não, não há conhecidos, amigos, ou ... Existem apenas estranhos. Incrível, eu me encontro com estranhos. Afasto o olhar de um lado para outro. E lá está o semáforo: Vermelho! Mas, por que o vermelho está no topo, em posição superior, sobre todos os demais? O que significa o vermelho, enfim? A proibição, o limite, a coerção. Divago: Antes de tudo a proibição; esta é nossa vida, nossa realidade. Creio que a primeira palavra a ser decodificada pela criança é o NÂO.

Logo depois vem o amarelo, ou melhor, o alerta, a restrição, o incômodo. Por que amarelo? A cor da desventura, a cor sacrificial. Nossa viver é isso: infelicidade, infortúnio. O semáforo somente aponta para a condição otimista, a expectativa de melhora; é quando mais demora a trocar de cor. Amarelo também pode propor a descontração, inspiração... contudo, ainda somos os mesmos obstaculizados, os ainda coagidos, proibidos pela precedente vermelhidão.

Em seguida e por último a lâmpada de cor verde. O que é isso, o verde? Enfim a realização da permissividade, o direito de ir e vir levado à efeito, a possibilidade, a liberdade. E mais uma vez vagueio, ou melhor, fantasio: quanta coisa precede a liberdade! Seria a servidão o berço da liberdade? Penso em La Boétie. Outra coisa curiosa: O lema do Iluminismo declara em primeiro lugar a Liberdade; só depois viriam a Igualdade e a Fraternidade. Mas o semáforo inverte o foco. Quem estaria coma razão?

No sinal verde os autos arrancam irresponsáveis; motores roncam, esbanjam cavalos de força, insinuam-se por entre ruas, vias, calçadas ...; eles são potencialmente letais. Então permito-me a um último questionamento? Estamos, com efeito, preparados para desfrutar da tal liberdade?

Nenhum comentário:

Postar um comentário