Desta vez versarei sobre determinado hábito alimentar. Diz-se que as companhias (boas ou más) fazem com que desenvolvamos hábitos... É verdade; sou testemunha viva de tal assertiva. Há aproximadamente 50 anos, eu e meu pai saíamos de casa às 04:30 (madrugada) para trabalhar. Embarcávamos em um ônibus já bastante “disputado” e durante duas longas horas atravessávamos o Rio de Janeiro até o desembarque final na Praça Tiradentes. É bom frisar que à época não existia Metrô, ou VLT, ou BRT ou qualquer outro meio de locomoção a exibir sigla bizarra. A opção pelo trem era descartada, haja vista a distância de nossa residência até a estação mais próxima.
E lá estávamos nós na famosa (e até mal
afamada) Praça Tiradentes, antigo Campo da Lampadosa. De lá meu pai seguia a
pé rumo à Praça Mauá; eu, por minha vez, tinha que embarcar em outro ônibus
para poder chegar em Botafogo (não, não existia Vale Transporte). Todavia,
antes de seguirmos nossos rumos, fazia-se necessário o desjejum. Então, na
esquina da rua Sete de Setembro, em antiga pastelaria, abancados à moda provinciana,
nos deliciávamos a comer pastel de queijo acompanhado de caldo de cana.
Bem, infelizmente, existem pessoas que
conseguem - ou esforçam-se para - ver o mal em tudo que as rodeia. Sim, esses maniqueístas
do século XXI transformaram o pastel em um dos vilões da culinária. Esqueceram-se
os pessimistas de plantão que nossos pasteizinhos eram fritos em óleo novo,
fresco, com muito menos gordura saturada que certos assados, e que, quando
acompanhados de sucos naturais mostram-se deveras saudáveis. E o suco natural
em questão é o caldo de cana, que não ficou imune aos olhares malignos dos
cientistas borra-botas que parecem sentir prazer em apontar malefícios.
Contudo, o caldo de cana fortalece o sistema imunológico, aumenta a hidratação
do corpo, é fonte instantânea de energia, combate ao câncer e o envelhecimento
precoce, é diurético natural e auxilia no combate à formação de cálculos
renais.
Nesse momento vós me perguntais: E teu
pai sabia de tudo isso? Respondo-vos com honestidade: Certamente não; ele
apenas repassava aos filhos seus modestos hábitos, ou melhor, sua mineiridade.
Sim, meu pai e seu jeito mineiro de ser, de observar, de educar... Certamente
seus hábitos também foram assimilados. A querer ou não, há patente sabedoria nos
costumes antigos, inclusive na culinária mineira. Bem mais tarde, ainda nos anos
setentas, quando em Belo Horizonte, a trabalhar na rua Januária, no bairro da
Floresta, costumava não só degustar, mas também observar várias pessoas a comer
pastéis de queijo e a beber caldo de cana em certa cantina à rua Pouso Alegre.
Lógico, mineiros como meu pai, igualmente despojados.
Agora fico a me perguntar por um desfecho
a esse brevíssimo relato... Certamente não há “moral da história”, nem
conclusão. No entanto, podemos pensar em uma recôndita inferência: apelemos de
quando em vez para a memória e recordemos - se possível - dos hábitos que os
antigos nos tentaram passar, de suas conversas, costumes, valores. Deixemos um pouco
de lado as pantominas e bazófias recorrentes dos que se fazem cientistas, dos
que se dizem sábios, dos que se travestem em autoridades.
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