Se tivessem renunciado simplesmente a uma crença religiosa, a coisa seria mais simples; tratar-se-ia de ceticismo, incredulidade. Mas não, não houve apenas renúncia; abandonou-se o mistério em prol de uma tecnologia subjugadora. E essa atípica apostasia, por certo, mostrar-se-á sobremodo nociva. As pessoas abdicaram de si mesmas em prol de um personagem; o si mesmo já não tem importância. O ser restringe-se ao lado obscuro do computador ou da tela do telefone celular e isso o satisfaz; parte expressiva da população vive o não-ser. O não-ser quer ser; isso tem nome: influencer. As pessoas não querem ser elas mesmas; querem ser outras, alguém ou algo que as transcenda, que as torne celebridades. Nesse caso, o abandono de si não significa humildade, mas vaidade. Criados os personagens, seus criadores a eles se submetem. Sim, vivem apenas para manter vivas suas criações. Eis a importância dos seguidores, dos likes, das curtidas.
Todavia, as vias crucis continuam. O momento de encarar o si mesmo, o retorno
ao ser real faz-se premente, necessário. Então a “farsa eletrônica” não mais
surte qualquer efeito. Vem a solidão, a tristeza, a depressão, o vazio da artificiosa
existência. Longe do personagem, de seu deus particular, o ser vê-se perdido. O
que fazer? Orar ao Instagram? Ao caridoso Twitter? Prostrar-se de joelhos
diante do WhatsApp? Clamar ao Facebook? Não, o desespero acicata, ferreteia. Despojado
do não-eu, o eu aflige-se. As drogas, então, vêm como recurso, como sucedâneo,
uma espécie de saída medicamentosa para o vácuo, para o tédio. Mais uma vida
esvai-se. O novo deus, a lutuosa tecnologia, infelizmente, tem grande alcance. “A
todos, os pequenos e os grandes, os ricos e os pobres, os livres e os escravos,
faz que lhes seja dada certa marca sobre a mão direita, ou sobre a fronte, para
que ninguém possa comprar ou vender, senão aquele que tem a marca, o nome da
besta, ou o número do seu nome”. (Apocalipse 13:16,17) O suicídio, por certo, será o desfecho.
Kundera dissertou acerca da Imagologia, porém, as sociedades atuais, já não mais contetam-se apenas com aceitação do mundo, passaram a exigir não só reconhecimento, mas idolatria. A vaidade tornou voraz o ego antes adormecido.
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