Teria sido um sonho? Desde aquela noite faço-me a mesma pergunta, o que atesta minha patente dessabença. Estaria eu sendo estimulado pela vera realidade? Sim, de início pareceu-me real, mas depois... imagens, circunstâncias e situações rápidas, porém nítidas. Estava em um funeral; via pessoas, familiares a vagar. Então procurei localizar-me. Foi quando ergui-me do esquife. E lá estava meu corpo, ou melhor, o que até então me servira de invólucro. Assustei-me com a cena: meu rosto sereno, mãos cruzadas sobre o peito, o terno e a gravata a servir de adorno. Dir-se-ia uma mórbida elegância. Pisei o chão da capela e pus-me a vagar por entre os visitantes. Ninguém dava por mim. Se eu pertencesse a recente geração, por certo consideraria: “Pior do que estar morto é não ser notado!”
Súbito um olhar a encarar-me: menino
de 4 anos talvez, aloirado, bonitinho. E ele falou alto e em bom som: - “É o
vovô; ele está aqui!” Meu neto?! Desconhecia aquela descendência. Gritos,
choros e olhares vagando a minha procura. Eu não tinha onde nem porque
refugiar-me, pois passavam por mim, esbarravam em mim... Não, não esbarravam.
Passavam através de mim. E dizem que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no
espaço. Se bem que... meu corpo repousava no ataúde. A agitação tomou vulto;
alguém apressou-se em chamar um padre. Só me faltava essa: ser exorcizado
depois de morto. E quando a balbúrdia mostrava-se inadministrável, acordei.
E a pergunta: Acordara de fato? Ou despertara
para a verdadeira não-vida? De pé ao lado da cama eu buscava por um corpo, pelo
meu corpo. Mas o corpo estava em mim, ou eu no corpo... sei lá. E dali em
diante, o que seria, de fato, viver? Quem sabe uma morte mascarada? Dúvidas perseguem-me,
contudo uma quase certeza se me apegou: vivemos apenas o arremedo do que chamam
vida!
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