terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Mau-caratismo educacional



O presente texto poderia ter por título “Procedimentos Antipedagógicos”, ou talvez “Paideia da Indiferença”. No entanto, parece-me que todos os títulos se revelam como sinônimos em face da deplorável realidade no que concerne à educação no país. 

Uma primeira observação diz respeito à mercantilização do ensino. Sim, neste caso não há outro termo para definir tal realidade. Desde o ensino fundamental até o terceiro grau, não há rígidos critérios para se autorizar o funcionamento de instituições educacionais. Tanto na pré-escola como na alfabetização existe todo um discurso, no qual as instituições se autodeclaram fiel seguidoras do construtivismo. Balela; mera retórica. A maioria não sabe sequer de que trata o processo cognitivo. No ensino fundamental não é diferente, os modelos educacionais obedecem, via de regra, aos padrões estabelecidos por “educadores” vinculados à ideologia marxista, onde tem início a linha de montagem do “analfabetismo funcional”. O ensino médio vem dar um primeiro arremate ao que já fora iniciado na etapa precedente, ou seja, intensifica-se o processo de manipulação comportamental, no qual se busca alimentar a adolescência com forte carga ideológica, e, mais uma vez, olvidando os conteúdos necessários à boa formação.

No nível superior, quando em universidades públicas, o processo chega a seu auge, principalmente nos cursos das áreas humanísticas, artísticas e educacionais. As matrizes curriculares são montadas de tal forma que os conteúdos sempre abrangem os mesmos aspectos e os mesmos autores. Não há espaço para pensadores que divirjam nem para pensamentos dialéticos. A cobrança nas avaliações, apesar de todo um discurso que diz contemplar o raciocínio crítico e a liberdade de pensar, pauta-se em analisar apenas o nível de assimilação doutrinária, onde mais uma vez, conteúdos fundamentais são deixados de lado. Eis o pensamento crítico, isto é, aquele que desconhece qualquer antítese. E este processo que difama a própria educação tem continuidade no mestrado e doutorado. Projetos são analisados à luz de “linhas de pesquisa”, ou seja, dos interesses de alguns em dar continuidade à farsa educativa. Um dos critérios ocultos nos processos seletivos para os cursos de pós-graduação é o paternalismo, o nepotismo. Não há espaço para o ineditismo, para o genuíno, pois ao final de tudo ainda existe uma CAPES ou um CNPq. Não vos espanteis, pois é comum “doutores” falarem mal o português coloquial. Escrever, então ... Outro idioma? Para que?
   
Quando o ensino superior é proporcionado por instituição privada, o que se vê, por um lado, é a preocupação do Estado em fabricar uma população “culta”, portadora de diplomas de graduação; por outro, o empresário que visa apenas o lucro. Não há o menor comprometimento em proporcionar ensino de boa qualidade. Os discentes são tratados como clientes, e a conduta comercial é seguida à risca, ou seja: “o cliente tem sempre razão”. Não há critérios para avaliações; o importante é o “cliente” ficar satisfeito. Os professores são “orientados” (estou fazendo uso de um eufemismo) a não reprovarem, a “facilitarem” a vida dos alunos. Aqui eu lhes reclamo a atenção para a “Paideia da Indiferença”, pois a quase totalidade dos professores acatam as exigências das instituições sem o menor questionamento. Na verdade, as orientações pedagógicas se amoldam às demandas dos clientes. Não se reprovam alunos por falta de comparecimento às aulas; as avaliações devem ser as mais simples e objetivas possíveis; os conteúdos devem se adequar à capacidade de assimilação do alunado; devem ser empregados todos os recursos possíveis para se ter 100% de aprovação. Sim, importante: estes "brilhantes" alunos avaliam seus professores, algo que recebe acompanhamento da psicopedagoga. Este lindo título é ostentado por aquele (a) que tem como papel fundamental defender os interesses dos empresários; não se pode perder alunos, afinal o FIES é garantidor de boa parte dos recursos das empresas. Professores preocupados com suas avaliações e, dessarte, em manter o emprego, tornam-se indiferentes às práticas profissionais.

Estes “Procedimentos Antipedagógicos” - esta perversão - tem início ainda na época do vestibular, ou melhor, no não vestibular. Em grande parte destas instituições não se realizam provas; em algumas delas somente uma redação. Pasmai! A mor parte das redações são escritas em um dialeto totalmente estranho ao português. Os alunos não sabem juntar sujeito, verbo e predicado numa mesma oração. Tudo lhes é facilitado para o ingresso nas instituições, bem como sua permanência até o final do curso. Na verdade, o que temos? As pessoas compram seus diplomas a crédito, e a maior parte delas custeadas pelo governo federal.  

Houve uma época, e isso faz muito tempo, que ao final do curso de graduação tinha lugar uma banca para realizar arguição oral no formando. Recentemente, as bancas se reuniam para arguir sobre o trabalho monográfico apresentado pelo discente. Mas as reclamações dos alunos fez com que as ações pedagógicas se adaptassem: não mais bancas, nem mais trabalhos monográficos; agora bastam artigos. Os alunos reclamavam de que não se sentiam à vontade diante das bancas, sentiam-se envergonhados, etc. Ora, tentai imaginar, alunos formandos em Direito ou Pedagogia mas envergonhados no falar em público.

Bem, por último, pretendo abordar o “Mau-caratismo Educacional”. O aluno pode, desde que sob pagamento, encomendar via internet seu trabalho de conclusão de curso, indiferente se artigo ou monografia para graduação, se dissertação de mestrado ou se tese de doutorado. Todavia, qualquer professor pode - pois que deveria conhecer o potencial de seus alunos - reconhecer, através do trabalho apresentado, o plágio ou a não autoria do mesmo. Não, não há qualquer referência a este tipo de atitude no código penal; não há crime. O que existe, de fato, em todo o nosso processo educativo é apenas a manifestação de um enredo macabro que conta não apenas com o biltre que oferece a confecção de semelhantes trabalhos pela internet, mas com a canalha que contrata os referidos trabalhos e a patifaria de professores que fazem vista grossa a toda esta pedagogia teratoide.

Eis a pátria educadora!

Um comentário:

  1. Sensacional. Sintetizou com maestria o nosso "progresso" na educação nos últimos 40 anos. Lembro-me daquela música nos "stand-ups" do Juca Chaves, "...Este é um pais que vai pra frente, oh oh oh oh oh...". Mas enquanto tocava a música, o caranguejo, ah!!! o caranguejo....andava de costas!!!!

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