sábado, 1 de dezembro de 2018

E se for o andar de baixo?



Estamos a viver um momento ímpar; além das preocupações cotidianas devemos nos voltar às possíveis consequências das circunstâncias que se nos apresentam: Trump desacata e ofende a Kim Jong-Un; escândalos de corrupção grassam por todo o mundo; depois do Zica vírus, da Chicungunha, da Dengue, nos vimos às voltas com uma nova epidemia de Febre Amarela; os temporais, as nevascas, os tornados, as secas, a miséria, a fome, o desemprego, a depressão, o pânico, a violência por parte ou dos estudantes norte-americanos, ou da marginalidade brasileira, ou dos terroristas islâmicos. Sim, as balas perdidas tão contumazes no Rio de Janeiro. Em suma: sentimo-nos cada vez mais frágeis e desamparados. A preocupação com a ameaça à vida torna-se imperativa. Ou seria preocupação com a morte? Bem, uma das poucas coisas que consegui aprender em filosofia foi “o homem é um ser para a morte”. E este clichê motiva o presente texto. Sim, no Brasil - não nos enganemos ou façamos o gênero hipócrita - ensina-se filosofia a partir de clichês.

Curioso é que as pessoas, em geral, ao se referirem à própria morte, partem do pressuposto que existe uma outra dimensão a ser vivida e falam em céu, paraíso e até mesmo em “andar de cima”. Mas eu vos pergunto: e se for o “andar de baixo”? Atenção: não aceito qualquer dimensão intermediária como proposta inicial; a região límbica só deve ser aceita como solução dialética. Portanto, insisto na pergunta: e se for o andar de baixo? Este seria mais a nossa “cara”, pois é bem mais popular, mais pé-no-chão, menos elitista e/ou menos oligárquico. Defendo a tese de que o Inferno nos é mais propício; Dante Alighieri já o demostrou na Divina Comédia. Em uma de suas frases lapidares, diz-nos o autor: “No inferno, os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise”. E é exatamente isso o que fazemos: mostramo-nos neutros nos momentos de crise. Algumas vezes somos incapazes de identificá-las, outras mostramo-nos indiferentes às mesmas, outras ainda permitimo-nos enganar por políticos ou ideólogos que nos manipulam, corrompem e subornam a atestar a inexistência de crises. Logo, por uma exigência lógica, o inferno nos é bem-vindo. 

Todavia, o fato de, futuramente, ter que habitar o andar de baixo não me causaria tanta espécie; o problema estaria na convivência obrigatória com um sem número de figuras que ter-me-iam povoado a existência. Exemplifico. Imaginemos Gilmar Mendes a sofrer uma penalidade bem nos moldes de Dante: na bocarra ele ficaria eternamente entalado com a Constituição Federal. Eu poderia antever o magote de advogados perambular de cá para lá a buscar auxílio, mas sem nada conseguir porque a língua lhes fora arrancada; eu veria políticos rotos, esmolambados, sujos, feridentos, famintos, sedentos a serem perseguidos por enormes ratos; eu veria a desfaçatez estampada na cara de mulheres seminuas em busca de aventuras sexuais, sem, contudo, encontrarem qualquer macho que lhes quisesse satisfazer, pois que estes, quando em vida, foram por elas marginalizados, acusados, inclusive, de assédio. Mas o que mais me chamaria a atenção seria o espectro de Karl Marx; ele trajaria o manto púrpura de algum pároco e mostrar-se-ia coberto de joias; pelo que pude inferir neste meu devaneio, ele recebera a pior acusação: Apostasia! 

Um comentário:

  1. Caramba, depois dessa é melhor me posicionar, de preferência pelo lado correto. Não estou afim de encontrar ninguém por lá.

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