Dou início ao brevíssimo ensaio a falar de expectativas. Parece-me que o convívio, seja familiar ou social, nos leva a criar expectativas. Sim, esperamos sempre mais dos outros do que de nós mesmos. Alguma coisa próxima da esperança faz com que acreditemos ter supostos diretos; expectativa é lugar improvável onde trabalha-se com meras probabilidades. Mas enfim, e lamentavelmente, a expectação, na mor parte dos casos, deságua em decepção; sim, as expectativas são fontes de decepções. E como fugir do malogro, da desilusão? Uma resposta puramente racional aconselharia a total descrença, a não expectação, a negação de quaisquer esperanças. E, ipso facto, abandonaríamos também as características de seres humanos.
Minhas decepções foram muitas; sim, e
é bom frisar: minhas decepções. As decepções são de responsabilidade única do
expectante; decepcionar deveria ser verbo defectivo, pois conjugado apenas na
primeira pessoa. Decepcionei-me com companheiros de trabalho, vizinhos,
conhecidos, familiares, amigos (???), etc. Ao tentar resumir, posso dizer que a
totalidade das minhas relações foram as fontes de minhas decepções. Então vós,
meus prováveis leitores (mais uma expectativa) diríeis: “Tu és o elemento
complicador das relações!” Bem, réu confesso que sou, respondo-vos: mea culpa, mea maxima culpa, muito
embora certa corrente de pensamento declarar que quando há um mea culpa não há
sinceridade. Todavia, tenhamos em conta minha sinceridade: sem querer atribuir
a terceiros qualquer culpa por ter-me tornado este “elemento complicador”,
garanto-vos que sou fruto de uma sociedade que estimula expectativas. E onde
buscar alento em face das desditosas esperanças?
Então descubro-me um jardineiro. Não
um Jardineiro Fiel, pois não sou diplomata nem tive qualquer parente
assassinado; pretendo nada investigar. Um simples jardineiro! Fiel somente a
este introito botânico. Não me envolvo com paisagismo; cuido de jardins.
Percebi-me apto e hábil a manusear e conviver com vegetais. Identifico folhas
compostas; limbos divididos em folíolos. Não faço distinção entre
monocotiledôneas e peninérveas. Nas flores, observo cálices e corolas; estimulo
a visita de abelhas, borboletas, demais insetos e aves inseminadoras. Eu as águo, as limpo, proporciono-lhes
minhocas que produzem húmus; eu as adubo, folhas aparo, procedo as podas, as aparto
de ervas daninhas. Posso vos afiançar: não há expectativas, não há decepções.
Os vegetais não reclamam, não me afrontam, tampouco agradecem. Nossa relação é
simples, calada, livre de recursos linguísticos e encenações. Minha realização
está em vê-los desenvolverem-se, florirem... Tenho em cada flor uma parte de
mim; em cada pequena mudinha a amizade que se me revela; em cada novo botão um
filho, se assim o quiserdes.
E a sociedade? perguntar-me-eis. Bem,
ocorre-me ser canteiro abandonado, terra maninha, ressequida, infértil; plantas
em desalinho, desfiguradas, amarelecidas; flores baldas, murchas e fenecidas.
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