sábado, 6 de outubro de 2012

A Paixão e o Tempo



O tempo traz em si a característica ímpar da incomensurabilidade.  Santo Agostinho assim o demonstrara: como medir algo que não mais existe, o já decorrido, que atravessa o que não tem extensão, o presente, e chega ao que ainda não aconteceu, o porvir? O tempo é uma dimensão puramente perceptual, pois que implica movimento. Para cada um de nós o tempo decorre de modo diferenciado. Todavia, insistimos em mensurá-lo, e isso só e possível através de convenções. Na verdade, nós espacializamos o tempo.
Mas muito embora não possa ser medido, nós com ele travamos uma relação. Ora, longe de qualquer jocosidade, podemos afirmar que o tempo é filho de seu tempo. Houve uma época em que o tempo nos era parceiro, companheiro; podíamos passear ao longo das alamedas e observar detalhes, avisos, letreiros, outdoors. Hoje o tempo nos precede; já não mais desfrutamos de sua companhia, já não mais passeamos. Atualmente, corremos atrás do tempo, pois as coisas se transformam em velocidade vertiginosa. E, ipso facto, abandonamos detalhes, porque as transformações assim o exigem.
Isso nos leva a uma “corrida contra o tempo”. Aproveitamos sempre o momento presente, porque “o tempo voa; escorre pelas mãos”. Nós adensamos todas as nossas relações porque o tempo fluente - a transformação sistêmica - assim o requer. E não é diferente quando se trata da paixão. A fluidez do tempo nos torna apaixonados. A paixão aqui é totalmente abrangente, mas inegavelmente efêmera. Tratamos de tudo - não só as relações amorosas - intensamente, mas também momentaneamente. Somos súditos do império da efemeridade. Carpe Diem! 
Amamos (?) intensamente porque o momento presente é o único que acreditamos ser acessível; amanhã a pessoa, o amor, a paixão, todas as relações, enfim, podem estar indisponíveis. Nada cômoda essa situação. Não obstante, o ser humano a tudo se amolda, se adequa, se acomoda. Então seguimos nossa vidinha agitada, confusa, carente, sorrindo na tentativa de demonstrar bem estar. Não esqueçamos, no entanto, que o fugaz, exatamente por ser fugaz, banaliza as relações, sejam elas de companheirismo, de amizade, de família, de amor e sexo.

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