Comecemos por citar Platão: “O tempo é
a imagem móvel da eternidade imóvel”. É dessa forma que o tempo se manifesta,
ou seja, como mobilidade. Porém, o que é dar movimento à imobilidade? Bem,
parece que, quando melhor observado, descobrimos que o tempo empenha-se em nos
pregar uma peça. Santo Agostinho auxilia-nos em equacionar semelhante ilusão,
quando analisa as divisões do tempo: presente, futuro, passado. Sim, o tempo pode ser
dividido, mas nunca mensurado, medido. O tempo é algo unicamente perceptivo,
individual. Seres humanos, maquiados de ciência, pretenderam mensurar o tempo,
mas, em verdade, criaram apenas uma convenção; eles simplesmente espacializaram
o tempo. Vejamos! O que chamamos presente? Ora, o presente é inextenso. Como encontrar
o exato momento do presente? Seria o mesmo que tentar dividir infinitamente um
espaço finito. O presente, então, seria apenas uma ocasião intuída. E o futuro?
O que é, de fato, o futuro? Futuro é apenas expectativa. Programar o futuro é
pretensão; quais e quantas são as variáveis a interferir em acontecimentos
vindouros? Estariam os seres humanos dotados de viés adivinhatório? Nesse caso,
proponho o termo divinatório, algo típico de um xamã ou próximo da divindade. Honra
seja feita: A sabedoria popular nos adverte que “o futuro a Deus pertence”.
E o que nos resta, afinal? A eternidade
imóvel: o passado! Esta a única dimensão acessível. Onde está todo nosso
conhecimento? No passado. Adquirimos cultura em fontes passadas. Arquivos eternizam
o passado. Onde nosso curriculum vitae?
No passado? Estai atentos: somos felizes ou infelizes em função do que nosso
passado revela. Arriscamo-nos a falar de amor, mas a convivência, as
afinidades, a admiração e o respeito, fundamentos essenciais ao vero amor,
originam-se num passado, seja ele próximo ou distante. Programamos nosso
futuro? Não, buscamos dar solidez ao passado e dele nos locupletamos. Quem
somos hoje, erradamente entendido como presente, reflete apenas o que fomos,
ontem, anteontem, há um mês, um ano, etc.
A título de inferência, posso então vos declarar: estamos fadados à unidimensionalidade. Todavia, em face desta incômoda circunstância, lancemos mão de recurso eufemístico e declaremos: o viver é adimensional. Nada obstante, descubro, ainda refém da estupefação, que justamente o viver adimensional é o que ou quem dá mobilidade ao imóvel.
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