sábado, 22 de junho de 2019

Amico mio



Estava eu de férias em Florença, na famosa e não menos exuberante região da Toscana. Meu deleite, já que conhecimento é prazer, experimentava o ápice quando em visitas a palácios e igrejas na cidade símbolo do Renascimento. Meu italiano, muito embora a colaboração de Roberto Benigni, era bem resumido. E graças a ele, Benigni, eu usava e abusava do romântico “Buongiorno, principessa”. Este era o mote de que me utilizava para cumprimentar e chamar a atenção da simpática hospedeira, que com algum esforço orientava-me com seu inglês típico da “cosa mostra”. E foi desse jeito que apresentou-me a Carlo Collodi Terzo, senhor já bem entrado em anos, neto do autor de “As Aventuras de Pinocchio” e que, apesar da idade, conseguia falar com desembaraço e exibir sorrisos joviais.
Em outra oportunidade, lembro-me inopinadamente, conhecera alguém cujo avô fora também renomado: em Mikonos, Grécia, conheci o neto de Nikos Kazantzakis. Sim, o neto, cujo nome não me recordo, possui ou possuía um restaurante especializado em iguarias a base de frutos do mar. Não obstante a boa memória, algo me causa incômodo: pessoas da minha idade, da minha geração, podiam ser consideradas como pertencentes a uma geração de netos. Nossos avós, sim, foram pessoas de destaque, não celebridades; nossos avós foram patriarcas, esteios, exemplos, ícones. E a nós cabe ou coube a mais embaraçosa das partes: sermos esnobes.
Mas retornemos à Florença e seu curioso personagem. Certa tarde, refestelados em um terraço ornado de flores, visitado amiúde por esvoaçantes farfalle, depois de algumas taças do maravilhoso vinho de Chianti e sorrisos a granel, signore Carlo segredou-me algo estarrecedor. Disse-me ele que a tentativa de manter viva a memória de seu avô o levara a realizar as mais ousadas pesquisas. A partir de As aventuras de Pinocchio, sua obra maior, o neto resolveu buscar as desdobramentos e consequências dos personagens Geppetto e Pinocchio. É óbvio, a história não terminara daquele jeito. O reencontro entre os dois não se realizou simplesmente após um deles, Pinocchio, ter-se transformado em ser humano normal. Não, a coisa vai bem mais longe. Para melhor compreensão, vale a pena relembrar um pouco da história oficial.
Geppetto, carpinteiro ou marceneiro? Faz diferença? Bem, vamos a ele, Geppetto, além de carpinteiro, fazia um bico como manipulador de marionetes, haja vista sua condição humílima. Ao conseguir o bloco de madeira com um tal de Antônio, dá início ao esculpir do boneco. Todavia, ele começa pelas pernas. Perguntamo-nos: Por que? Coisa que só o manipulador e carpinteiro pode responder. Quando somente as pernas estavam prontas, o futuro fantoche começa a chutar seu criador. Cosa pazzesca! Mas ... continuemos. Ao ficar totalmente esculpido e depois de ter aprendido a andar, Pinocchio sai correndo e entra na cidade. Preso pelos carabiniere, acusa Geppetto de não gostar de crianças, o que leva seu criador a ser detido e acusado de maus tratos. Conselho Tutelar? Geppetto, depois de libertado, demonstrando o amor do criador por sua criatura, substitui os pés queimados do boneco e chega a vender seu único casaco para comprar livros e matriculá-lo na escola. Mas uma coisa chama a atenção do velhinho carpinteiro: o nariz de Pinocchio está maior; cada vez que o boneco mente seu nariz cresce. Atentai para o detalhe: a mentira é apenas reflexo de uma personalidade doentia. Em Pinocchio não havia integridade, honra, caráter ilibado e/ou qualquer princípio moral. A marionete foge de casa e Geppetto constrói um barco para dar início a busca por sua criatura. Levado por um pombo, Pinocchio encontra Geppetto navegando à deriva; lançado na água, o boneco de madeira tenta nadar em direção ao velhinho, até que ambos são engolidos e levados à praia por enorme atum. Pinocchio tornar-se-ia menino depois de zelar a cabeceira de seu pai até que ele se refizesse da doença adquirida.
Bem, de posse destas informações básicas, podemos dar continuidade ao que não é de vosso conhecimento. Segundo as pesquisas do signore Carlo, Geppetto, ao retornar para casa, não reassumiu a profissão de carpinteiro; woodcarving se assim preferirdes. O fato de o boneco Pinocchio ter-se transformado em menino conferiu destaque ao velhinho; a ele, inclusive, foram atribuídos poderes místicos. Foi procurado por um grupo de empresários, financiados pela família Fellicci, “cosa nostra”, que propôs financiar a construção de vários bonecos esculpidos, e depois que adquirissem vida – anima – seriam colocados em pontos chaves do governo. Afinal, apesar de terem aparência humana, na verdade não passariam de fantoches, marionetes, ou seja, fáceis de manipular. E assim foi feito. Geppetto enriqueceu, dando origem a uma vasta produção de bonecos, cujo problema com a hipertrofia nasal foi corrigida. Os bonecos tornados bambini seriam entregues a famílias de imigrantes italianos.
Não só na Itália, mas em grandes potências do mundo pode-se perceber claramente a presença e influência de marionetes em cargos e funções de destaque. Talvez isso possa explicar as duas grandes guerras, a revolução bolchevique, o surgimento do comunismo/ socialismo, o politicamente correto, a teoria da terra plana, etc.  Acontece que nem todos os bonecos, ao adquirirem o status de humanos, conseguem desempenhar a função de marionetes; alguns deles rebelam-se e pensam ter liberdade para fazer o que lhes dá na telha. E isso aconteceu com um exemplar confiado à família de imigrantes italianos vinda para o Brasil: a família Toffoli. Segundo ainda signore Carlo, este exemplar hoje é membro do judiciário daquele país, que junto com outros exemplares – exemplares estes oriundos de bonecos rejeitados pelo controle de qualidade da linha de produção da Geppetto’s enterprises e contrabandeados para o Brasil; gente sobremodo abjeta – pretendem fazer da nação uma pocilga.
Aqui solidarizo-me com os brasileiros: Pior do que ser manipulado é ser manipulado por fantoches!

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