Estava
eu de férias em Florença, na famosa e não menos exuberante região da Toscana.
Meu deleite, já que conhecimento é prazer, experimentava o ápice quando em
visitas a palácios e igrejas na cidade símbolo do Renascimento. Meu italiano,
muito embora a colaboração de Roberto Benigni, era bem resumido. E graças a
ele, Benigni, eu usava e abusava do romântico “Buongiorno, principessa”. Este
era o mote de que me utilizava para cumprimentar e chamar a atenção da
simpática hospedeira, que com algum esforço orientava-me com seu inglês típico
da “cosa mostra”. E foi desse jeito que apresentou-me a Carlo Collodi Terzo, senhor
já bem entrado em anos, neto do autor de “As Aventuras de Pinocchio” e que,
apesar da idade, conseguia falar com desembaraço e exibir sorrisos joviais.
Em
outra oportunidade, lembro-me inopinadamente, conhecera alguém cujo avô fora
também renomado: em Mikonos, Grécia, conheci o neto de Nikos Kazantzakis. Sim,
o neto, cujo nome não me recordo, possui ou possuía um restaurante
especializado em iguarias a base de frutos do mar. Não obstante a boa memória,
algo me causa incômodo: pessoas da minha idade, da minha geração, podiam ser
consideradas como pertencentes a uma geração de netos. Nossos avós, sim, foram
pessoas de destaque, não celebridades; nossos avós foram patriarcas, esteios,
exemplos, ícones. E a nós cabe ou coube a mais embaraçosa das partes: sermos
esnobes.
Mas
retornemos à Florença e seu curioso personagem. Certa tarde, refestelados em um
terraço ornado de flores, visitado amiúde por esvoaçantes farfalle, depois de
algumas taças do maravilhoso vinho de Chianti e sorrisos a granel, signore
Carlo segredou-me algo estarrecedor. Disse-me ele que a tentativa de manter
viva a memória de seu avô o levara a realizar as mais ousadas pesquisas. A
partir de As aventuras de Pinocchio, sua obra maior, o neto resolveu buscar as
desdobramentos e consequências dos personagens Geppetto e Pinocchio. É óbvio, a
história não terminara daquele jeito. O reencontro entre os dois não se
realizou simplesmente após um deles, Pinocchio, ter-se transformado em ser
humano normal. Não, a coisa vai bem mais longe. Para melhor compreensão, vale a
pena relembrar um pouco da história oficial.
Geppetto,
carpinteiro ou marceneiro? Faz diferença? Bem, vamos a ele, Geppetto, além de
carpinteiro, fazia um bico como manipulador de marionetes, haja vista sua
condição humílima. Ao conseguir o bloco de madeira com um tal de Antônio, dá
início ao esculpir do boneco. Todavia, ele começa pelas pernas. Perguntamo-nos:
Por que? Coisa que só o manipulador e carpinteiro pode responder. Quando
somente as pernas estavam prontas, o futuro fantoche começa a chutar seu
criador. Cosa pazzesca! Mas ... continuemos. Ao ficar totalmente esculpido e
depois de ter aprendido a andar, Pinocchio sai correndo e entra na cidade.
Preso pelos carabiniere, acusa Geppetto de não gostar de crianças, o que leva
seu criador a ser detido e acusado de maus tratos. Conselho Tutelar? Geppetto, depois
de libertado, demonstrando o amor do criador por sua criatura, substitui os pés
queimados do boneco e chega a vender seu único casaco para comprar livros e
matriculá-lo na escola. Mas uma coisa chama a atenção do velhinho carpinteiro:
o nariz de Pinocchio está maior; cada vez que o boneco mente seu nariz cresce. Atentai
para o detalhe: a mentira é apenas reflexo de uma personalidade doentia. Em Pinocchio
não havia integridade, honra, caráter ilibado e/ou qualquer princípio moral. A
marionete foge de casa e Geppetto constrói um barco para dar início a busca por
sua criatura. Levado por um pombo, Pinocchio encontra Geppetto navegando à
deriva; lançado na água, o boneco de madeira tenta nadar em direção ao
velhinho, até que ambos são engolidos e levados à praia por enorme atum.
Pinocchio tornar-se-ia menino depois de zelar a cabeceira de seu pai até que
ele se refizesse da doença adquirida.
Bem,
de posse destas informações básicas, podemos dar continuidade ao que não é de
vosso conhecimento. Segundo as pesquisas do signore Carlo, Geppetto, ao retornar
para casa, não reassumiu a profissão de carpinteiro; woodcarving se assim
preferirdes. O fato de o boneco Pinocchio ter-se transformado em menino
conferiu destaque ao velhinho; a ele, inclusive, foram atribuídos poderes
místicos. Foi procurado por um grupo de empresários, financiados pela família
Fellicci, “cosa nostra”, que propôs financiar a construção de vários bonecos
esculpidos, e depois que adquirissem vida – anima – seriam colocados em pontos
chaves do governo. Afinal, apesar de terem aparência humana, na verdade não
passariam de fantoches, marionetes, ou seja, fáceis de manipular. E assim foi
feito. Geppetto enriqueceu, dando origem a uma vasta produção de bonecos, cujo
problema com a hipertrofia nasal foi corrigida. Os bonecos tornados bambini
seriam entregues a famílias de imigrantes italianos.
Não
só na Itália, mas em grandes potências do mundo pode-se perceber claramente a presença
e influência de marionetes em cargos e funções de destaque. Talvez isso possa
explicar as duas grandes guerras, a revolução bolchevique, o surgimento do
comunismo/ socialismo, o politicamente correto, a teoria da terra plana, etc. Acontece que nem todos os bonecos, ao adquirirem
o status de humanos, conseguem desempenhar a função de marionetes; alguns deles
rebelam-se e pensam ter liberdade para fazer o que lhes dá na telha. E isso
aconteceu com um exemplar confiado à família de imigrantes italianos vinda para
o Brasil: a família Toffoli. Segundo ainda signore Carlo, este exemplar hoje é
membro do judiciário daquele país, que junto com outros exemplares – exemplares
estes oriundos de bonecos rejeitados pelo controle de qualidade da linha de produção
da Geppetto’s enterprises e contrabandeados para o Brasil; gente sobremodo
abjeta – pretendem fazer da nação uma pocilga.
Aqui
solidarizo-me com os brasileiros: Pior do que ser manipulado é ser manipulado
por fantoches!
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