Domingo; não um domingo qualquer. E o
que o tornava diferente era a quantidade de netos e netas presentes. Hoje,
neste exato momento, a muito custo consigo recordar-me de 11 (onze) pessoinhas,
– eu inclusive – cujas idades variavam dos 8 (oito) aos 15 (quinze) anos. Vovó
e vovô deviam ficar alucinados com a gritaria, as rusgas, os desentendimentos,
os risos... Mas vovô conseguia pôr ordem na casa e administrar aquela
balbúrdia. A hora do almoço, por incrível que possa parecer, era o momento de
maior entrosamento entre a petizada. A enorme sala do sítio abrigava uma
daquelas mesas monásticas, e ela, a mesa, por sua vez, reunia à sua volta toda
a pirralhada. Mãos lavadas, sentados em cadeiras ou tamboretes, frente ao
prato, ao copo e talheres, na expectativa de provar as iguarias da avó.
E lá vinha vovó com bandejas,
depósitos e panelas, e as espalhava pela superfície da mesa adornada pela
clássica toalha xadrez. Ela servia o prato do marido em primeiro lugar e depois
os netos menores; os mais velhos podiam servir-se sem o menor risco de qualquer
desastre. Por último, nossa avó sentava-se à direita do esposo e tinha início o
nosso banquete. Acredito que, para que nós, os netos, nos mantivéssemos calados
à mesa, minha vó valia-se de um recurso próximo à psicologia reversa: somente
ela falava. E aproveitava a ocasião para contar-nos histórias.
Certa vez, contara-nos vovó Hannah, um
jovem chegara à cidade com o intuito de arranjar colocação em escritório
contábil de parente distante. Tratava-se de rapazola inexperiente, interiorano
e não muito lapidado; era falante, algo belo e chistoso. O trabalho que
pleiteava seria coisa simples, o que poderíamos entender como típico de um
office boy. Apesar da pré aprovação do parente, a senhora responsável pelas
contratações entendeu, talvez para cumprir apenas um tipo de “rito processual”,
realizar uma espécie de entrevista com o rapaz. Haja vista a patente falta de
conhecimento específico na área contábil e a simplicidade no exercício da função
pretendida, a senhora optou pelo questionamento pessoal. Foram perguntas acerca
da família, do grau de instrução, religiosidade, etc. Todavia, como o jovem se
fizesse simpático e de uma prolixidade extremamente agradável, a funcionária
resolveu estender um pouco mais a prosa, fazendo-se, por sua vez, também
espirituosa. Disse a senhora: – Bem, vou fazer-te mais algumas perguntas – e
prosseguiu disfarçando um sorriso – Presta bastante atenção! O rapaz respirou
fundo e pareceu concentrar-se. A mulher disparou: – O que um rapaz solteiro
guarda debaixo da cama? O jovem abaixou a cabeça, dissimulou o riso e
respondeu: – Seria o penico? A mulher permitiu-se rir à larga e
obtemperou: – Falas do urinol –
valendo-se de um eufemismo. E corrigiu: – Mas não, a resposta correta seria um
par de chinelos. O rapaz balançou a cabeça em anuência. A funcionária, então,
fez a segunda pergunta: – O que um casal guarda debaixo da cama? O rapaz pôs-se
a pensar, pensar... e após algum tempo murmurou um lacônico “Não sei”. A
senhora decepcionada adiantou-se: – Simples, dois pares de chinelos. E na
tentativa de evitar que a conversa se tornasse tensa, informou: – Pois bem,
vamos a última questão; esta é fácil! Olhando o rapaz nos olhos perguntou: –
Qual é o nome daquela fruta vermelha que se usa na salada ou como tempero?
Desta feita, a resposta veio de imediato. O rapaz ergueu-se e com um amplo
sorriso, decretou: – Três pares de chinelos!
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