quarta-feira, 14 de julho de 2021

Antigo pecado

 

Não me reporto a pecados outrora cometidos; aqueles característicos da saudosa juventude. Não. Eu falo do conceito que precede o pecado. Sim, porque o pecado como conhecemos (erros cometidos, mal procedimento, o confrontar de declarações contraditórias, etc.) deve-se ao advento do judaísmo cristão. Então vós me perguntais: “Ora, e antes do surgimento desse nosso pilar - a religião - não haviam pecados?”  Eu, pelo menos por enquanto, não me arriscaria em proferir um sim ou um não. Contudo, advirto-vos que os gregos falavam em Υβρισ (hybris), ou seja, um insulto, uma ofensa realizada com desprezo, uma insolência, uma injúria, uma afronta, e mais uma vez o confrontar, ou seja, a acareação entre contraditórios. Se bem que o insulto, a ofensa, a insolência e injúria presentes no conceito grego, estariam relacionados ao excesso, ao descomedimento, ao desequilíbrio, uma afronta ao justo meio aristotélico (não ao meio aritmético). E o que seria o justo meio aristotélico? Lancemos mão de um exemplo: entre os extremos Covardia e Temeridade existe a Coragem. Todavia, em nos valendo de melhor acurácia, percebemos que a Coragem estaria mais próxima da Ousadia, ou seja, da Temeridade. Eis o justo meio!

Nada obstante, o conceito de hybris relaciona-se diretamente à natureza; seria o insulto, a afronta, o descomedimento no que tange à natureza. Sim, falamos em preservação e respeito a physis (natureza). Em se observando a medicina proposta pela escola hipocrática, poderemos depreender que a ciência médica trataria somente de reequilibrar os organismos tendo como base a natureza. Os descomedimentos, os excessos provocariam um desequilíbrio orgânico em confronto à natureza.

Enfim, acredito que agora possa responder vosso pioneiro questionamento. Eis o nosso maior, mais antigo e grave pecado: os excessos que agridem a natureza, inclusive a nossa natureza, a natureza humana. Para finalizar, lanço mão de verso presente em antiga canção popular: “Água de mais mata a planta!”  

domingo, 4 de julho de 2021

Voto de aplauso

 

A Ciência Jurídica no Brasil é algo singular; por isso gravada em maiúsculas. Sim, volta e meia somos “agraciados” (seria melhor brindados?) com um parecer, decisão ou até mesmo sentença, no mínimo, atípica. Duvidais? Pois bem, aqui vai um exemplo. É bom frisar: trata-se de exemplo, não de situação hipotética. Certo magistrado, creio que sobremaneira empenhado em minimizar a ação de seu afeiçoado, estabeleceu entendimento ímpar, baseado evidentemente em torpe hermenêutica, no tocante a determinada acusação de estupro. Sim, o meritíssimo entendeu que tratava-se de um estupro culposo, não doloso, ou seja, o rapaz estuprou sem a intenção de fazê-lo. Lógico, a mulher que dizia-se vítima, fora, na verdade, a causadora do delito, pois que seduziu o jovem moçoilo induzindo-o a fazer o que não queria. A pretensa vítima sim, deveria ser processada pelo crime de sedução, quiçá, por assediar o acusado. Ocorre-me, então, a dúvida: devemos levar tal ciência a sério?  

Não obstante, mesmo em face da seriedade requestada pela dita ciência, não raramente nos deparamos com algo risível. Não?! Vejamos. A prostituição é entendida como uma alternativa de trabalho, haja vista as desigualdades econômico-sociais. (Justificativa) Desde 2002, portanto, a prostituição passou a ser reconhecida pelo Ministério do Trabalho como profissão, muito embora a exigência de idade mínima:18 anos. Donos de prostíbulos não cometem crime algum, desde que não explorem serviços sexuais alheios, segundo o entendimento da 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Curioso é que cresci aprendendo que caftinar era não só ilegal como também imoral. Papai deve ter-se enganado. Mas... continuemos. Baseado na Lei 10.097, de 19 de dezembro de 2000, o dono de um famoso lupanar contratou para seu “negócio” alguns Jovens Aprendizes, todos com mais de 18 anos de idade. Pergunto-vos: cômico ou repulsivo?

Mas meu voto de aplauso vai para nosso STF, o Supremo Tribunal Federal, o Tribunal Constitucional, a Corte Suprema do país. Buscai imaginar Suas Excelências a prolatarem sentenças para crimes ainda não cometidos. Estaríamos diante da releitura de Minority Report, a Nova Lei? Duvidais? Pois bem. Prevaricar é crime cometido por funcionário público quando busca ocultar, retardar, deixar de praticar de ofício ou pôr-se contra certa disposição legal expressa, na tentativa de acobertar ilícito, visando satisfação pessoal. O que daqui se depreende é que prevaricar é crime subsidiário, é algo acessório, secundário. Arrisco-me a falar em epifenômeno, pois que a doença deve ser declarada para que outros sintomas sobrevenham. Há que se confirmar a ocorrência do crime para aventar-se possível prevaricação. Todavia, nossa Suprema Corte vem se preocupando mais em comprovar sintomas secundários do que provar a existência da conjuntura ilícita.  E torno a perguntar-vos: cômico ou repulsivo?

sexta-feira, 2 de julho de 2021

Ativismo Judicial

 

Estava eu em Tegucigalpa, Honduras, a realizar algo próximo de uma pesquisa histórica; dir-se-ia uma viagem Cult. Quase 19:00 horas, 7 da noite, portanto, conduzido pelo apetite, adentrei Malportado, um restaurante local a servir comidas latino-americanas. Já refestelado na cadeira do estabelecimento, pude ouvir a notícia divulgada pela TV local: a CIA divulgara os nomes dos maiores grupos a abrigarem bandidos e terroristas em todo o mundo. Pasmai! Dentre o Hamas, o Estado Islâmico, a Al-Qaeda, o Boko Haram, o Talibã, o Hezbollah, estava o Fórum de São Paulo, o grupo que reúne partidos de esquerda, sindicalistas e declara-se anti-imperialista. Contudo, sabemos que o objetivo final é criar a URSAL, ou seja, a União das Repúblicas Socialistas da América Latina.  

A decepção, adicionada à revolta em presenciar mais uma vez o nome de minha pátria envolvida em escândalos escabrosos, fez cessar de imediato qualquer resquício de fome; o apetite evadira-se. Lamentável, pois as pessoas que se autodeclaram de esquerda, jamais conheceram ou vivenciaram qualquer experiência em países governados pela esquerda. A ignorância, a desinformação reelaborada pela falácia manipuladora cria a expectativa de conquista, estimula a ganância e molda um ambiente propício à egolatria desenfreada. O apedeutismo é explorado e mesmo assim sente-se grato. Eu arriscaria estabelecer um elo com a Síndrome de Estocolmo, onde a vítima desenvolve sentimentos pelo agressor, com ele identificando-se emocionalmente.

Eu ruminava pensamentos e palavras enquanto sorvia margaritas. Meu olhar errava pelo recinto. E neste vaguear deparei-me com um conhecido personagem: Raymond Reddington! Sim, inegavelmente era ele, pois até Dembe Zuma estava a seu lado. Atenção: eu não falei em James Spader, mas simplesmente em Reddington. Eu o encarei, ele sorriu, abandonou a mesa e veio sentar-se a meu lado. Disse ter percebido meu mal-estar. Enquanto libávamos outras margaritas eu desabafei. Dembe nos vigiava de longe. Reddington esboçou seu pior sorriso; algo misto de lamento e deboche. Passados alguns segundos anunciou-me algo ainda bem pior: disse-me ele que em sua Black List acrescentara nosso STF, nossa Corte Constitucional.

Ergui-me, cambaleei até a porta do restaurante e inalei o ar que momentaneamente faltava-me. Reddington ainda sorria zombeteiro quando tornei a sentar-me. Estalou os lábios depois do gole de margarita e pôs-se a tudo relatar. O Supremo Tribunal Federal assumira de vez a postura expansiva e proativa. O povo brasileiro experimentava, então, o ativismo judicial. Na verdade, o judiciário carregava a pretensão de governar o país sem receber um voto sequer. Ora bolas, isto além de anticonstitucional é antidemocrático. Não pude rebater tais declarações, pois sabia de antemão que o judiciário invadira a esfera do executivo quando retirou do presidente atribuições a ele garantidas pela Constituição Federal; que exigiu do legislativo abertura de CPI, bem como a instauração de um processo de impeachment. Nosso Corte Constitucional, de fato, brinca de polícia, pois investiga, dá voz de prisão, condena e outras cositas más. É bom destacar que o artigo 142 da Constituição pode ser aplicado quando há essa invasão de competência entre os poderes.

Não obstante, o que mais me chocou na revelação foi que, além do ativismo judicial, pautado na ideologia de esquerda, haja vista o empenho em descriminalizar as drogas, aprovar o aborto, suprimir relações familiares e perseguir religiões, o STF está envolvido em tentativa de assassinato, pois o atentado à faca ao então candidato à presidência, passados 3 anos, ainda não foi explicado. A polícia federal oculta muita coisa, pois enxerga o povo brasileiro como imbecil. O acusado ainda não foi posto em liberdade pelo STF, porque não cabe habeas corpus em casos de sentença a ser cumprida em manicômio judiciário.

O telefone tocou, Reddington atendeu: tratava-se de algum problema com Elizabeth Keen. Minha fonte e seu acompanhante despediram-se e deixaram-me entregue às lucubrações. Vós não podeis imaginar o quanto eu gostaria de isentar, pelo menos, um ministro de nossa Corte Suprema, mas fica difícil fazê-lo. Todavia, dentre eles, o que mais me decepciona é o atual Presidente da Corte. O senhor Luiz Fux não só agride a nação brasileira e a ciência jurídica, ele desmoraliza o judaísmo enquanto instituição, ele vilipendia o povo judeu, ele desdenha do povo escolhido de Deus.

Data muitíssima vênia, tomo a liberdade de citar a Vossa Excelência um alerta que deveria orientar as ações de todo e qualquer magistrado: “Ai dos que decretam leis injustas, dos que escrevem leis de opressão, para negarem justiça aos pobres, para arrebatarem o direito aos aflitos do meu povo, a fim de despojarem as viúvas e roubarem os órfãos!” Isaías 10: 1 e 2

quinta-feira, 1 de julho de 2021

Fashion diseases

 

Confesso-me um tanto inseguro para abordar e/ou dar início ao tema. Pensei na modalidade conto, pois, muito embora a gravidade do assunto, teria nuanças algo lúdicas e sobremodo satíricas. Formulei, inclusive, ideias acerca de um personagem animal, um bicho selvagem, um protagonista poderoso (ou seria apenas mero coadjuvante?). Pois bem, este seria o leão, batizado por Adão, se bem que a fera perderia muito de sua característica no que tange à dieta. Sim, eu falo de um leão vegano. Este leão, apesar de toda reconhecida ferocidade, tornar-se-ia refém de astuciosa falácia. E quem seria este outro personagem, (protagonista ou coadjuvante?) capaz de manipular aquele que detém o título de “rei dos animais”? Lógico, só poderia ser um charlatão traiçoeiro que atende pelo nome de Dráuzio, uma hiena macho, com cara de sofredora e com achaques de pieguice social. Não, nada pessoal, apenas a personificação de uma medicina midiático-curandeirística.

Todavia, percebo que o pretendido conto não atenderia a abrangência que o assunto requer. Então, assim que abandono os personagens da vida selvagem, vem-me à mente um fato assaz interessante que, certamente, tornou-se marco de uma distante juventude: houve uma época em que a moda exigiu da mulher a obrigatoriedade na companhia de motociclistas. E como comprovar o status de acompanhante? Simples, tornou-se comum as jovens exibirem como troféu a pele das pernas queimadas pelos escapamentos das motos. Algumas, as não vitimadas pelos “escrupulosos” pilotos, usavam a lâmina de uma faca fumegante para implantar queimaduras na pele das próprias pernas. Atentai! Estou a falar de seres humanos que detêm como apanágio a racionalidade.

Ainda bem que esta moda tornou-se démodé. Sim, o modismo é isso: conhece rápida ascensão, arrebanha prosélitos, estabelece comportamentos e em curto período de tempo entra em declínio. Quando professor, enquanto aguardava o início da aula, sentado próximo a entrada da sala, percebi que as alunas, de um modo geral, vestiam-se do mesmo modo: calça jeans de cintura baixa e uma blusa curta, independente da cor, com o umbigo de fora. A imagem de uma manada surgiu instantaneamente diante de meus olhos. Enfim, essa é uma geração que clama por liberdade.  

Nada obstante, deve-se ter em mente que a moda não se limita ao uso de roupas, palavreados ou comportamentos; atualmente partilhamos nosso dia-a-dia com as “doenças da moda”. Pergunto-vos: O modismo nas doenças sempre existiu? Pode ter acontecido, é óbvio, mas sinceramente não me recordo. E pautado nas minhas não recordações, arrisco-me a declarar que as Fashion Diseases são características da pós-modernidade. Parece-me que a pós-modernidade traz esse viés antípoda, isto é, a tudo contraria, a tudo se opõe. E a justificativa para tal oposição é o vazio de uma falácia que se autodeclara ideológica.

Mas voltemos a falar de assuntos sérios. Falemos, portanto, das doenças da moda: Os seres humanos foram declarados mamíferos porque possuem glândulas mamárias e produzem leite para alimentar suas crias. Desde tenra idade e até muito antes, sempre soube que o leite, não só o materno, mas também o leite de gado é imprescindível na alimentação humana. Meu pai, meu avô, o bisavô, o pai dele e assim por diante poderiam corroborar o que digo. Contudo, os dias atuais com sua estropiada ciência optaram por demonizar a lactose. Eu nunca ouvi esta mesma ciência - por isso estropiada - questionar os produtos químicos misturados ao leite e laticínios para necessária conservação. A indústria alimentícia agradece; eles criam um leite sem lactose, uma café sem cafeína, uma cerveja sem álcool. Sim, e quando as não vítimas da lactose apresentarem carências, será a vez da indústria farmacêutica desfazer-se em mesuras e em lucros, evidentemente.

Falemos agora do glúten. Este componente tornou-se famoso, sendo apontado como único culpado pelo ganho de peso e mal-estar intestinal dos glutões. Curioso é como os criminosos são considerados suspeitos de crimes mesmo quando os confessam; o glúten já foi apontado, indiciado, julgado e condenado. Conceitualmente falando, esta proteína está presente em alguns cereais como trigo, a cevada, o centeio e o malte. Após o processo de demonização midiático-curandeirístico, a pseudo ciência jamais questionou a validade e/ou apontou seus dedos para os alimentos transgênicos. Pergunto-vos: a engenharia genética pode mensurar as consequências futuras nas alterações provocadas no DNA das sementes? Creio corrermos o risco de uma futura geração de X-Men.

Mais uma vez a indústria alimentícia vem nos “socorrer” e cria alimentos sem glúten. Contudo, assim acredito, não mais teremos cevada, centeio, trigo ou malte, mas uma outra coisa qualquer. Lancemos mão, portanto, de uma situação hipotética: para corrigir o andar do caranguejo, o bichinho que só anda para trás, modificou-se geneticamente o movimento em suas articulações. Agora o caranguejo terá o andar de uma Gisele Bündchen quando em passarelas da vida. E a pergunta que não quer calar: mas ainda tratar-se-á de um caranguejo? E quando as carências surgirem nos “acautelados” com o glúten, a indústria farmacêutica, por certo, de muito boa vontade, apresentará um substitutivo aos “bem informados”.

Abri vossos olhos ó raça embrutecida e na ignorância mantida; buscai pensar por vós mesmos. Bem, não sou de dar conselhos, sugestões ou algo que o valha. Apenas um alerta: vossa saúde, bem estar, longevidade, etc., a ninguém preocupa. Sois apenas números sem valor, que em face de protocolar condução, forneceis números para um balancete que visa somente valores.

segunda-feira, 14 de junho de 2021

Flatus delivery

 

Enfim domingo: o dia do concurso. Não estranheis, mas eu precisava prestar o concurso (se não fosse este seria um outro), afinal o problema da idade aliada à crise econômico-pandêmica construíram minha ruína financeira. A aposentadoria tornou-se apenas um título curricular, um status em negativo. Nada obstante, há que ser levada em conta o problema da idade; não posso nem mesmo ser tratado por “maduro”, pois minha maturação é intempestiva, démodé. E com a idade vêm os “incômodos” característicos. Sim, problemas de intestino e de incontida flatulência. Mas acordei bem disposto naquele domingo. Barbeei-me com esmero, uma roupa bem transada, calçado tipo sapa-tênis; eu desfilava elegância. E assim, entusiasmado e confiante, deixei a casa.

Em pouco menos de vinte minutos cheguei ao local da prova: um colégio bem conhecido situado em bairro próximo. O relógio marcava sete da manhã quando o portão abriu-se. Identifiquei-me e dirigi-me à sala nº 1. Cumpri os trâmites necessários, ou seja: embalei e lacrei as chaves do carro, o telefone celular e demais objetos em certo envelope plástico. Assinei a presença e escolhi o local no qual me sentaria durante a realização da prova. Já acomodado, pus-me a pensar no tempo decorrido desde a última vez que ocupara assentos como aqueles. Anos? Décadas? Tive o pensamento interrompido pela sensação de uma iminente liberação de gases. Tentei conter-me. Qual nada! E a inhaca teve lugar. As pessoas entreolharam-se enquanto torciam o nariz, muito embora o uso obrigatório da máscara para evitar a contaminação pela Covid19. Não pude conter a irrisão.

O bodum - insuportável, poder-se-ia dizer - seria percebido até pelos vitimados de Corona Vírus. Aquele não fora o único traque; eu diria que teve início um fenômeno que batizei de flatus delivery. As pessoas presentes começaram a reclamar, a tossir, a ficarem vermelhas. Alguém sentiu ânsias de vômito, acolá outro alguém experimentou, além de náuseas, um ligeiro desmaio. Vivenciávamos, portanto, uma enxurrada de flatus perversum. E os olhares voltaram-se para mim; acusadores, transtornados, ressentidos. Mas como descobriram minha autoria? Simples; é a mesma coisa que filho adolescente: os pais são os únicos que não reclamam. O fiscal de provas dirigiu-se a mim, ameaçando-me com expulsão; disse-me ele que eu seria retirado da sala por estar perturbando o ambiente e o bom andamento dos trabalhos. Em meio a outra saraivada de bufas, haja vista a ventosidade na qual eu estava imerso, respondi que ele consultasse o Edital; se nada fosse previsto no Edital, eu permaneceria em sala. E para concluir, exclamei, bem ao estilo da longínqua infância: “Os incomodados que se mudem!”

Pois bem, nada constava no Edital sobre candidatos acometidos de flatulência. E os incomodados se foram; quase todos deixaram o local e desistiram da prova. Pus-me então a pensar no quanto é irresponsável emitir juízos de valor acerca de males e vícios que nos são estranhos, afinal graças a minha flatosa característica, eliminei - pelo menos naquela sala - grande parte da concorrência. A propósito, aguardo ansioso pela nomeação e posse.   

quinta-feira, 3 de junho de 2021

Me and the imponderable

 

I believe that nothing is worse than the news that your life is threatened. I lie! Worse is when someone, out of ignorance, incapacity or irresponsibility, makes this threat absolute, unmistakable.

I was surprised not that "something abnormal" had lodged in my throat, but because that "something" had overcome my will and decision to stay alive. Suddenly, the words of old Spinoza occurred to me: “The being wants to remain in itself”.

I often went in and out of doctors' offices; different exams were required. In this constant pilgrimage, someone raised his voice opposing the diagnosis. The phrase beginning with “I think it's strange” no longer meant evil, but rather a way to preserve myself. That voice that declared otherwise acted on me; conduct based on experience, knowledge, wisdom, prudence.

A certain joy invaded me, but the “I find it strange” needed to be explained. I find myself threatened by suspicion; they gave me the benefit of the doubt. However, there is still “something abnormal”, but how to get it out?

Moreover, even after removed, can we declare it extinct? Only in this way can what is behind the “abnormal” reveal itself.

In the most chaotic way, I realize what I am very Cartesian about: if we are not sure of anything, we methodically doubt its existence.

quarta-feira, 2 de junho de 2021

A writing revolution

 


A step of incalculable consequences was taken when men, in the task of fixing and spreading thought, realized that it was possible to substitute the visual image for sound, to place the sound where until the moment he obstinately placed the figure. In this way, the object has completely freed itself from the signal and language has acquired its true nature, which is oral. Analyzing the sound of the words, the man realized that the sound was reduced in units exactly placed more or less independent of each other (as a sound) and clearly differentiable. From here, two types of writing emerge that mark this great and decisive revolution: syllabic writing, which the system bases on groups of sounds represented by a sign, and alphabetic writing, where each sign corresponds to a letter. The second represents, consequently, progress in relation to the first, since it reaches a limit of analysis that it had started. Therefore, we can say that alphabetical writing represents, in relation to syllabic writing, a great advance in the order of ideas, but an invaluable technical simplification.

terça-feira, 1 de junho de 2021

Just me and myself

I would like to live in any lighthouse, in any place. The lighthouse can illuminate rocks, beaches and islands where there are not persons, in the other words, empty landscapes. I love deserted landscapes. You could think that I am ill or mad or selfish. But no, I am not. I'm just a skeptical, and hence I don't believe in mankind. This way, I could preserve myself, I could protect myself.

My vision is the same of Hobbes' vision, that is, the man is the wolf of man. Governments come and go and the things remain the same; the persons born, grow and die, but remain demonstrating disdain for the others.

Like I said before, I don't believe in persons, and so will continue. Have no more respect. The people think just in itself and have forgotten the fellows.

Over there, in the lighthouse, I will transform myself. I can surpass myself. The rocks, seas and landscapes enlightened will be me. Suddenly, will have no more separation between me and all of around. It will be simply me, the navy-blue sky and the sea. I will be them and they will be me; they will be in me, and I will be in them. I will be all, but no feelings, no love, and no relationships. Just me and myself.


segunda-feira, 31 de maio de 2021

Dia dos Namorados

 

Em pouco tempo será celebrado o Dia dos Namorados, 12 de junho. Em outros países, no entanto, a data escolhida é 14 de fevereiro, quando se comemora o dia de São Valentim, isso em homenagem a um dos mártires da Igreja Católica, que lutou contra a proibição do amor romântico na Idade Média. Diz-se que a data celebra a união amorosa. E o que seria uma união amorosa? As ditas uniões estariam, de fato, relacionadas ao amor? Se fôssemos discorrer sobre o amor, estaríamos nos arriscando a plagiar O Banquete de Platão. Portanto, vamo-nos ater às relações hodiernas.

 Bem, depois que inventaram uma nova acepção para o verbo ficar, a coisa parece ter fugido um pouco ao controle e ao meu entendimento. Afinal ficar, no que tange aos relacionamentos amorosos, implica o não compromisso. Ora, o cortejar tem por objetivo a conquista, o requestar. O namorar, por sua vez, envolve sedução, o encanto, o início de um compromisso. Não obstante, o ficar, em minha ótica antiquada, não envolve qualquer compromisso. Se, de fato, assim for, percebo algo de incoerente: a juventude, que tanto fala de amor, submete-se espontaneamente a relações efêmeras? Não, muito embora a subversão valorativa do mundo atual, posso vos afiançar que ninguém quer apenas ficar; as pessoas gostam de ser amadas, não apenas usadas.

Depois deste introito não muito breve, vem-me à memória a cena de um namorico; este sim mostrou-se breve. Não posso garantir tratar-se de uma primeira namorada; na verdade, não saberia dizê-lo. Contudo, acredito ter gozado da injusta fama de namorador por conta desta horripilante experiência. O evento teve lugar em fins dos anos sessentas. Eu e os colegas de então costumávamos frequentar o clube recreativo no bairro em que morávamos. E foi no referido clube, na noite de um sábado qualquer que conheci Marion: jovem magra, de face alongada, cabelo louro e gestos estudados. E conversamos bastante ainda no clube, no período de descanso do conjunto. Atenção: não se tratava de banda, mas um conjunto de músicos.

Pois bem, após nos apresentarmos e discorrermos, cada qual a seu turno, sobre seu currículo peculiar e particular, resolvemos sair. Se não me falha a memória, ela teria mais idade do que eu. Disse-me morar na mesma rua do recreativo, pelo menos apontou certo sobrado bem próximo. Abandonamos o local e demos início ao lento caminhar que soe acompanhar o exercício do flerte. Atravessamos a rua, como se previamente combinados e nos aproximamos da esquina onde havia um armazém. Abraçamo-nos, encaramo-nos: a troca de olhares fixos, abrasados, carentes. Distante, uma cão uivou. Arrepiei-me; ela sorriu e conduziu-me para o canto escuro do muro. Confesso que pensei em sair, desistir, mas a libido parece ter falado mais alto... Chuviscos frios tiveram lugar. Refugiamo-nos sob a marquise.

Então beijamo-nos. Burt Lancaster inspirava-me em determinada cena de A um Passo da Eternidade. Pensei abrir os olhos e admirar o rosto de Deborah Kerr. E assim o fiz. Não, não era Deborah, nem mesmo Marion; ela também tinha os olhos abertos. O olhar era frio, maléfico, as feições contorcidas, disformes, um sorrir diabólico; ela nada falava e enlaçava-me a seu corpo. Seu olhar injetou-se de um vermelho sanguíneo; consegui desembaraçar-me de seu abraço. Corri sem olhar para trás. Ainda garoava. Voltei ao clube e refugiei-me no banheiro masculino. Refiz-me, retomei a calma. A imagem diabólica ficara em meu pensamento. Retornei para casa na companhia dos amigos sem nada confidenciar.

Noite terrível, conturbada, insone. Marion não me saía do pensamento; eu tentava comparar ambas as feições que a mulher apresentara, aquela absurda mutação. O dia chegou e encontrou-me sentado no leito. Aproximava-se o horário de meus pais saírem para a missa dominical. Estranharam por verem-me desperto. Sentei-me à mesa com eles; nada falei. Despediram-se e saíram. Pus-me a pensar, a relembrar de alguma coisa que pudesse justificar o que eu vira. Não fora noite de Lua cheia; cheguei a sentir, inclusive, a sensação das gotas finas e frias da chuva que nos encaminhara à marquise. Na Enciclopédia de papai busquei ler sobre bruxas, licantropia, magia negra, feitiçaria... Nada, eu deveria era ter ido à igreja com meus pais.

Troquei-me rápido, sem muito esmero. Saí de casa em direção à igreja. Mas ... eu cruzaria a esquina do clube recreativo, a mesma rua onde Marion afirmara morar. Desisti da igreja e tracei rumo para o sobrado que a mulher apontara. Aproximei-me com cautela; seria melhor dizer temor. Passei em frente ao portão gradeado e busquei devassar seu interior. Nada! Andei de lá para cá diversas vezes. Súbito, a porta do prédio abriu-se e um senhor apareceu. Mesmo tomado de surpresa, disparei um agônico Bom Dia. Ele percebera meu nervosismo, encarou-me com bondade e respondeu ao Bom Dia. Então perguntei se conhecia Marion. Disse-me morar ali há quase 30 anos e nunca ter conhecido ninguém com aquele nome; procurei descrevê-la fisicamente e ele negou ter visto alguém semelhante.

Agradeci e retornei ao lar. Marion, ou seja lá o que tenha sido, até hoje, passados mais de cinquenta anos, continua presente em meus pensamentos. Tive vários relacionamentos, talvez numa tentativa de livrar-me das imagens daquela noite. As relações sempre chegaram ao fim, mas nunca as lamentei, talvez porque a narrada experiência tenha causado em mim uma espécie de analgesia sentimental. Dito isto, pergunto-vos: Conhecera eu o amor? A propósito, desejo a todos um Feliz Dia dos Namorados!  

sábado, 29 de maio de 2021

The hard task of diplomacy


The term negotiate involves contracts, adjustments, agreements, treaties, implying the capacity to do so. Adjustment, in turn, involves combination, regulation and ipso facto conformation. The act of combining and / or regulating presupposes an end to contradictions and disagreements, which inevitably includes the possibility of adjustments or a loss.

Generally, the agreements signed between representatives of any government bring more the promise of compliance with the agreements than the commitment even to fulfill them, considering the specific interests of each party; it would be a kind of "hidden curriculum". Nevertheless, the alleged losses, even if previously calculated, would be subject to unpredictable demands.

The curious thing is that in any negotiation there is a hint of “negligence” of the parties involved; it would be something close to an already consolidated margin of error; "A previously forgiven sin"; await you for the violation.

Thus, in the case of signed agreements, although the parties are signatories, these “gaps” are somehow present. The constant need to relate to this rule of "carelessness", however, does not enable the State to use military force, established power or something like that, but impels it to a specific skill. This skill is a matter for diplomacy. Diplomacy would have a kind of gift for living soft and similar constraints, diligently interposing some postures. Diplomatic skill, in short, would be the appropriate mechanism to interact, to reconcile interests and regulate excesses, thus seeking a conformation, a negotiated adjustment.

Therefore, you ask me “What about the UN?” I answer you: It is very similar to Alice in Neverland.

quinta-feira, 27 de maio de 2021

A new Diaspora

 

 

The Muslim people have always been under some kind of ultra-conservative leadership. This type of leadership has as its main characteristic religious fanaticism and, consequently, truculence and despotism. In the past 40 years, we have witnessed the dictatorship of Mohammad Reza Pahlavi and his successor Ayatollah Khomeini in Iran. With the outbreak of the Iran-Iraq war, we met Saddam Hussein in detail. In Libya, Muammar Al-Gaddafi took power. Recently, in 2011, we met Hosni Mubarak in Egypt. These and other "statesmen" have always led the Islamic people through internal struggles between Shiites and Sunnis.

With invasions and wars promoted by the United States and allies, we know Al-Qaeda, Hamas, the Taliban and, finally, the Islamic State. However, the Muslim people themselves, despite prohibitions, persecutions and prisons, never left their homeland to live in other countries where the laws, behaviors and principles are so different, in addition to religion, of course.

We noticed, however, that under the dictatorship of Bashar Al-Assad a new phenomenon is taking place. The Syrian government pursues, arrests, tortures and kills its opponents like any dictator. The question is why are the Muslim people leaving their country? Is it a new feature of the Muslim mentality? On the other hand, is there some hidden intention behind it? Persecution, hunger, torture have been noticed in other countries in the Muslim world, but we have never seen such a diaspora.

This seems to be a protocol similar to the Jewish diaspora; however, it obeys a strategy to invade, dominate, and subjugate Western culture, thought and religion. Globalization and the digital dimension cannot explain this phenomenon. The events in Cologne - Köln - Germany have turned out to be a symptom and can confirm my concerns. According to German authorities, it was a series of coordinated attacks. I can add that, not by chance, it happened on New Year's Eve, an important and festive date in Western culture. The most recent event - the arson at Notre Dame de Paris - can exemplify my theory, because it was a deliberate act, with the aim of attacking and destroying the religious pillars of Western culture. Coordinated attacks on Jewish synagogues corroborate this warning. I believe that the next and last war will not focus on economic and political issues, but will be an ideological war, where peoples will fight for cultural and religious domination.

An unsuspecting reader may accuse me of justifying a segregationist policy, but the intention of the text is to warn that among the refugees, there are affiliates to the Islamic State; their members have like aim to co-opt sympathizers and Muslim’s descendants around the world.


Aftereffects of colonialism

 

Unlike slaves, the Brazilian Indians, being on their own land, were hostile to the colonizers. Blacks, far from their lands, forced to live with other ethnic groups and with latent conflicts of origin, lacked solidarity among their own. This lack of unity initiated a loss of identity, which may explain passivity.

This passivity has become responsible not only for incorporating foreign cultures, but also for a dependence regarding to their colonizers. The colonial mentality was something assimilated, built, faceted. The racial miscegenation and, hence education was tasked to solidify such a feature. However, not only our passivity and our stubborn dependence on a foreign model became emblematic.

However, save for better opinion, it seems that this trend has been changing since the beginning of the last century, especially in the arts. Let us remember the "Art Week of 1922”, as well as the musical model that gave rise to "Bossa Nova". Although its roots emerged from samba, a rhythm inherited from blacks, with the mix of American jazz and blues with black roots, "Bossa Nova" was almost universally accepted. In the field of architecture, can be exemplified the works of Oscar Niemeyer; his creations became models for all students and connoisseurs of architecture.

Of course we still need some sort of tour de force for the turn aside of alien models, especially when assimilated spurious values ​​which very dismiss of our reality and circumstances. I believe, therefore, that the subservience so characteristic of Brazil will change. However, it should not be something in the short or medium term, because culture brings in itself the prerogative to influence other models as well as to let be influenced by them.

terça-feira, 25 de maio de 2021

Credo quia absurdum est

“Acrescentou Deus: toma teu filho, teu único filho, Isaque, a quem amas e vai-te à terra de Moriá; oferece-o ali em holocausto, sobre um dos montes que eu te mostrarei”.      Gênesis, 22:2

Deus prometera descendência a Abraão, contudo, Sara, mulher a princípio estéril, só experimentou a maternidade em idade avançada. E o único filho do casal agora seria imolado...

Disponho-me a observar o dilema de Abraão. Sacrificar o próprio filho! Se bem que, pode-se falar efetivamente em dilema? Parece-me que houve opção satisfatória; nada de conjuntura difícil; pelo contrário, teve lugar uma sábia decisão. E por que crer literalmente no referido relato? Não estaríamos diante de uma linguagem figurada, de uma simbologia arquetípica? Afinal, afigura-se-me algo como uma situação absurda! Mas o que é o absurdo? Aquilo que repugna a razão. E quem nos garante que a decisão foi pautada na razão? Podemos falar em sensatez, em circunspecção e prudência? Creio que não.

Bem, posta de lado a razão, voltemo-nos à questão moral (pode-se até mesmo falar em ética). Pergunto-vos: no tocante à decisão tomada por Abraão, houve preocupação com a moralidade, ou seja, justiça, correção, decência, honestidade, integridade, probidade? Estes valores vinculam-se à ética. Percebemos, por ventura, na referida narrativa bíblica a preocupação em seguir regras de conduta? Parece-me que não... Sim, a moralidade, bem como a Ética têm origens na razão. Ora, se deixada de lado a causa, desprestigiadas estão as consequências.

Neste momento, ainda em função da moral, alguém evoca o pecado. Lógico, a moral não ignora o pecado; se o fizesse seria conhecimento vão, seria sem fundamento, algo totalmente fútil. E paradoxalmente, quando a moral admite o pecado, reconhece-o fora de sua esfera. O que nos resta? A razão nos permite discorrer e demonstrar conhecimento sobre o palpável, sobre o mensurável, sobre o real. Não obstante, revela-se limitada no que tange aos objetos que transcendem aquilo que é manifesto, que é evidente. E como devemos nos portar em presença do transcendente? A razão mostra-se inapropriada. Poderíeis, talvez, falar em dever. Mas de que trata esse dever? Dever moral, evidentemente. No entanto, dever moral é o compromisso assumido de um Eu consigo mesmo e com mais ninguém, o que ainda implica moralidade.

Ficamos, consequentemente, diante da fé. E esta não se vincula à moral ou à razão. A fé é paixão, a mais alta paixão humana. A tão louvada razão é nada mais que mero recurso da própria paixão. Muitos são os seres humanos que, sequer, conseguem alcançar esta grandiosidade da paixão. Abraão alcançou-a!

Há, por certo, preocupação (ou seria especulação?) acerca do imo consciencial de Abraão. Todavia, afirmo-vos que ele não se mostrou acomodado. Tampouco houve resignação; ele não renunciou a Isaque. Em momento algum o pai mostrou-se distante de qualquer preocupação com o filho. Sim, sem dúvida, a angústia esteve presente. E Abraão manteve-se em silêncio. Embora digam que o silêncio é armadilha do demônio, ele é também a etapa onde o indivíduo torna-se consciente de sua ligação com a divindade. A falta de coragem pode tê-lo incomodado, mas a isto não se pode chamar de humildade. Sören Kierkegaard já o afirmara: “A coragem da fé é o único ato de humildade”. Precisamos desse ato para aproximarmo-nos de Deus. O mesmo Kierkegaard afirmara; “Amar a Deus com fé é refletir-se no próprio Deus”. A atitude de Abraão sugere a reverência e a honra demonstrada por uma obediência inquestionável; uma total confiança. Yahweh Yir’eh, “O Senhor proverá” expressa toda a confiança que Abraão tinha no Senhor.

Evitemos, portanto, eleger o intelecto como panaceia a toda mundivivência; nem sempre a razão, a moral, a ética ou o dever atendem às demandas do cotidiano. E quando as coisas se nos mostrarem “absurdas”? Atenhamo-nos à fé; a fé partilha de nosso dia-a-dia. Precisamos crer. Não temamos! Nada de humildade fabricada! Sejamos corajosos! E se perguntados por que credes, respondei simplesmente: Creio porque é absurdo!  


quinta-feira, 20 de maio de 2021

O Super-homem

 

Dentre aqueles que atentaram contra - e acreditam ter matado - Deus é contumaz o argumento de que uma enérgica crise de valores os tenha vitimado; acreditam com isso justificarem a sucedânea carência de fé. Contudo, a espontânea privação da fé, ou sua fragmentação, precedeu a dita crise de valores. Ora, a substituição de uma crença por outra (uma não crença), pressupõe a necessidade mesma da fé. Em nada atenua falar em decepções. Historicamente, os desapontamentos andam pari passu ao existir humano. Todavia, pergunto-me: não seria o desapontamento instrumento de potencialização da própria fé? Na verdade, seres humanos, de um modo geral, necessitam de tutela, de sentirem-se amparados por algo que lhes transcenda os restritos limites, ou seja, de um objeto de fé; na falta deste percebe-se a busca por paliativos.

Voltemo-nos, portanto, aos desapontamentos e a consequente busca por paliativos. Em virtude da decepção com antiquados mitos, novos foram criados e até hoje são cultuados; desiludiram-se com os heróis, pois muitos deles se lhes assemelhavam no tocante às imperfeições, às depravações; experimentaram o malogro com o Deus único, pois em pouco tempo este foi tornado ditador, rancoroso, vingativo pelos que dele se diziam representantes. Então iniciou-se o abandono do suprassensível. Desapontaram-se com a ciência que lhes prometera felicidade; veio o fracasso na política que se apresentara como panaceia. Na insana procura pelo amparo de um substituto, lançaram-se à ética, se bem que a emenda confirmou-se pior que o soneto, pois esta, confundida com o moralismo, deu início a uma perda gradativa de valores.

O que restou, afinal? O Eu eclodiu, avultou-se, exacerbou-se. A resposta foi a supervalorização do indivíduo. Friedrich Nietzsche a definiu como “Der Wille zur Macht”, a Vontade de Poder, a única força que deve mover o ser humano; toda ambição, esforço, realização deve objetivar o alcance da mais alta posição durante a existência. Eis o Super-homem! Nada obstante, parece-me que humanos, cujas ações “não mais causam espanto”, em face de torpe hermenêutica, resolveram passar por cima de tudo e todos para tornarem-se novos deuses, tão semelhantes Àquele que lhes foi apresentado pelos sacrílegos e que julgaram assassinar. O filósofo, no entanto, assim creio, não contava com o surgir de “lacradores”, com a busca desenfreada das pessoas por tornarem-se celebridades, com o advento das selfies, com o granjear de seguidores nas redes sociais.   

Se me perguntado fosse pelos apanágios do mundo atual, eu diria consternado: ambientes frívolos, relações superficiais, poderosos em excesso, famosos em demasia... Deuses não; semideuses: abundantes, de caracteres efêmeros, nem mesmo dignos de cultos transitórios. E eu, como poderia conceituar-me em meio a esta criação bizarra? Eu sou alguém para ser temido, um Super-homem, e não por ter atentado contra Deus, mas sim por ter em Deus meu único aliado. Deus é minha principal força motriz, minha vontade de poder, conquanto algo nada ambicioso. E àqueles que duvidam, declaro: I’ll be forever!

terça-feira, 18 de maio de 2021

Do espírito crítico

 

É bastante comum usar como argumento justificador da educação, independente se em escolas fundamentais, secundárias ou de terceiro grau, o desenvolvimento do espírito crítico. Todavia, a meu ver, o afamado espírito crítico tem como pressuposto certo grau de informação. O conhecimento seria, portanto, conditio sine qua non para a realização desta exigência pedagógica.

E como referi-me à pedagogia, lanço mão de uma ferramenta sobremodo eficaz no ensino-aprendizagem: vou desenvolver o conceito de crítica, valendo-me de sua raiz histórico-etimológica. Vejamos! Iniciarei pelo idioma grego, e mais especificamente pela medicina grega. Pois bem, a ciência grega que procura debelar ou atenuar os males, a medicina, busca antes de tudo pautar-se na natureza. O fato de estar doente manifesta apenas um desequilíbrio entre ser humano e natureza, a physis. Pois bem, pergunto-vos: qual o termo médico utilizado para nos referirmos a uma doença qualquer, ou seja, a um desequilíbrio? Patologia, isso é, o estudo das doenças. A palavra patologia tem sua origem no termo pathos, empregado na medicina grega para falar em excesso, sofrimento, ou seja, um desequilíbrio.  

E vós, creio que por mera curiosidade, perguntar-me-ás: E o que isso tem a ver com crítica? Continuo. Já a saber o que é uma doença, um pathos, pergunto-vos: E como as doenças se manifestam? Muito bem, bravo; todos vós respondestes: Através de sintomas! Curiosamente a palavra utilizada na medicina grega para designar sintoma é krisis, isto é, um desequilíbrio sensível, a fase decisiva de uma doença. Devo lembrar-vos da crise de amígdalas, das crises renais, etc. Então observo vossa insistência: E onde entra a crítica nesse estudo linguístico? Pois bem, a fazer-me célere, respondo-vos: Já identificamos a doença, o pathos, através de seus sintomas, krisis, falta-nos apenas o tratamento da mesma, ou seja, o reequilíbrio. A palavrinha grega seria crítica, kritiki, a prática médica que leva à prevenção. A crítica portanto, está ligada à análise, à prevenção, à capacidade de julgar.

Em face do exposto, posso afiançar-vos que a capacidade de atenuar males e reequilibrar disfunções exige conhecimento. Assim como o médico, que demanda vários e vastos saberes para promover curas, todos aqueles que se propõem a sanar “desequilíbrios sociais” devem procurar conhecer em profundidade a temática em questão, a deixar de lado, inclusive, as ideologias. Muito embora a apologia feita ao espírito crítico nas escolas e universidades, as instituições vinculadas à prática educacional não contemplam o conhecimento. A vida escolar/acadêmica preocupa-se sim em desenvolver o sentido figurado do conceito de crítica, ou seja, a opinião desfavorável, a censura, a condenação. Esse apequenar do conceito depõe contra o próprio conceito, que acaba maquiado por um manto de fofoca.

Doravante, portanto, tenhamos atitudes maturadas, responsáveis, consequentes; deixemos de lado o vício contraído no trato com comadres e seus fuxicos ornamentais. Empenhemo-nos no aprendizado, no assimilar os mais variados saberes. Alguém, certa feita, declarou: “O saber não ocupa lugar!” Não mais exerçamos esta atípica “medicina ilegal” recheada de intrigas. Sejamos sóbrios em nossas apreciações, em nossas análises. E Ludwig Wittgenstein vem corroborar todo meu empenho: “A crítica pressupõe conhecimento”.  

segunda-feira, 17 de maio de 2021

De volta à Matrix

 

A engenharia social parece-me ter atingido seu apogeu. Na verdade, descaracterizou-se. O Demiurgo antiplatônico, mais conhecido por NOM - Nova Ordem Mundial - não manifesta qualquer escrúpulo, haja vista valer-se de ideologias, ciências e abundantes vícios para atingir seus desideratos. A pandemia está aí, originada em ambiente militar comunista, disseminada não só pelo vírus laboratorial, mas pelo aparelhamento esquerdista que pervade desde a ONU, passa por confrarias maçônicas e chega às bancadas e cenários midiáticos. Todavia Matrix pretende negar o ensaio de guerra biológica. Pergunto-vos: Por quanto tempo?

As pessoas em geral, não íntimas ou partícipes de minhas relações, até porque não as tenho, dizem-me ingênuo, uma ingenuidade que toca ao ridículo. Mas faço-me crente exatamente por não crer em realidades forjadas. Por que perder tempo em discutir o irreal? O irreal criado, até porque se fosse real careceria de criação, contudo, já revela excessos e precisa ser detido. Mas como, se a excêntrica caverna, em seu característico ambiente, é pródiga em artifícios para perpetuar-se? A cada dia que passa, programadas distopias difundem efêmeros modismos, a excentricidade de paladares, beberagens e drogas extasiantes, promessas de extensa felicidade e ilimitadas liberdades... O irreal, para melhor nos governar, constrói discursos que contemplam mais o indivíduo do que o Estado.

Consigo perceber ainda, o denominador comum existente entre mídia e política: à propaganda associam-se projetos de leis. A mídia esboça os primeiros rudimentos de uma insólita tônica comportamental. Reações surgem; são convocados “especialistas” para discorrerem sobre o inusitado. Os debates, na verdade uma farsa dialética, só servem para popularizar o desmando. Então os projetos políticos, apoiados na falácia verborrágica, selam o novo comportamento. As informações midiáticas não têm preocupação com o conhecimento, apenas introjetam e potencializam valores. Políticos não objetivam quaisquer bem-estares, pois já que igualmente manipulados, defendem interesses outros.

Preciso retornar à Matrix! Mas, dizei-me: Como - pelo menos - coibir seus excessos? De que modo destituir Matrix de sua posição de destaque? Como anulá-la enquanto ferramenta e veículo manipulador? Ocorre-me, salvo melhor juízo, mister a criação de uma irrealidade no interior da irrealidade existente. Faz-se necessário, a princípio, uma coexistência; nada de movimentos ou símiles de revoluções proletárias. Seria algo como um epifenômeno, uma co-irrealidade. Afinal, a negação de uma negação é uma afirmação. E como seria este novo “modus operandi”? Simples! Lancemos mão dos mesmos recursos de Matrix: a farsa, a dissimulação, a falta de escrúpulos, o cinismo... Desempenhemos nosso viés dramatúrgico; mostremos uma humildade rota, uma ingenuidade ofensiva. Exibamos o ridículo, a risibilidade em toda a sua dimensão; façamo-nos merecedor de escárnio, de zombaria. Mostremo-nos insignificantes. A pensar que detém total domínio, o novo Demiurgo não perceberá o sarcasmo. E o sarcasmo será a origem de nossa liberdade!  

domingo, 16 de maio de 2021

Eu, o anti-herói

 

Chuva, pandemia, pandemônio... sexta-feira. Meu nome? Não vem ao caso. Se pudesse (posso?) chamar-me-ia Antônio. Sim, eu seria inestimável; estaria acima de qualquer estima. Se bem que... talvez fosse melhor Luís, eu seria então um combatente glorioso. Contudo, não abriria mão de certo detalhe: meu sobrenome deveria ser Saavedra; não interessa se por parte de mãe ou de pai. Em verdade vos digo que não passo de personagem; um não cavaleiro de triste figura. Explico-me: tentaram fazer de mim um amálgama de situações condicionais, buscaram calar minha independência. Por que não dizer o fruto resultante de enxertos com restrições acidentais? Fato é que intentaram fazer-me mais uma vítima de levianas manipulações comportamentais; diligenciaram direcionar minhas opiniões. E como justificar-me? Não, não se trata de humildade. Neguei-me à espiral do silêncio. Eu simplesmente já não temo o ridículo, pois busco verdades. Livre? Sou, e como o sou! Exatamente porque ando lado a lado com a verdade. E os cínicos indagam: o que é verdade? Pela ótica da engenharia social tudo está relativizado, principalmente a verdade. E essa relativização lhes é benfazeja.

Todavia debato-me, não silencio; no máximo faço-me mouco. O fato de ser ridicularizado empresta-me notoriedade; não que eu a busque, mas por tornar-me fonte de incômodo aos cínicos que contra mim deblateram. Faço-me rude, escarneço, debico. Muito embora ciente do desemprego, a crise econômica criada por obscuro experimento (ensaio furtivo de uma guerra biológica), permito-me sorrir do Lockdown (seria um quase sorriso, talvez uma irrisão). Sim, as ruas desertas, os combustíveis caros. Fique em casa! (isso repetido à exaustão). Muitos dos governantes, coitados, acoitados por um judiciário decadente, a julgarem-se exímios ditadores, não conseguem perceber que são também peças de reposição da mesma engenharia social. Meu sorriso agora é largo. Pensando bem, reconheço-me como anti-herói; anti-heróis, em essência, prodigalizam mais heroísmo do que os heróis clichês. E no papel de um não cavaleiro da triste figura, não obstante a chuva, lanço-me no quintal a lavar roupas e cantarolar o verdadeiro Luiz, o de origem diversa, o Luiz Melodia. “Lava roupa todo dia, que agonia, na quebrada da soleira, que chovia...” Se bem que não há agonia. A agonia é dialeticidade, seria o anticinismo, algo assim como uma ética do faz de conta.    

terça-feira, 4 de maio de 2021

Inconsequências e coincidências

 

O ano é 2023, fins de setembro mais exatamente. Um primeiro caso no estado de São Paulo, capital. Profissional de saúde, funcionário do estado, encontrado morto em seu leito. Em decúbito dorsal, corpo tenso, olhar aterrorizado, a exibir uma pele esverdeada, coberta de algo parecido com escamas. A rigidez cadavérica reclama a atenção dos que colocam o corpo no carro funerário; parece uma tora de madeira. O que seria? Outro tipo de doença? As perguntas avultavam-se. A autópsia demorou dias. A origem de tudo estava no sangue que coagulara. Um vírus circulante na corrente sanguínea encarregara-se de tudo. Exames e exames foram realizados. Sim, algo fora inoculado no sangue daquele cidadão. Mas o quê? Dias e mais dias para chegar-se a um resultado. O único componente presente nos diversos exames, que não se encaixavam no que se entende por normalidade, compunha a vacina Coronavac, administrada há quase dois anos na população. Outros casos surgiram: mesmo modo, mesmas características.

Muito embora a tentativa de comicidade no parágrafo anterior, disponho-me a alertar-vos de que as vacinas usadas até o momento são apenas profiláticas; elas simplesmente estimulam o contato, haja vista a presença de partículas semelhantes ao vírus ou virus-like particles (VLP). Os ditos fármacos administrados no combate ao Covi19 não contém o DNA viral; não são terapêuticos; não controlam as infecções crônicas ou doenças degenerativas instaladas no indivíduo.

Bem, e como tenho em minha personalidade a incontrolável faceta de observar coincidências, aqui vai mais uma: apesar do caos instalado no orbe terrestre, seja de ordem sanitária ou econômica, a China continua a apresentar superávit em seu PIB; sua economia cresceu e muitos empregos foram criados. Mas não deixemos de lado certo acontecimento simultâneo: apesar das numerosas populações, China e Rússia revelaram-se como grandes fornecedores de vacinas aos demais países do mundo. Curiosidade: ambos comunistas e de governos ditatoriais. 

Os países que dizem esbanjar democracia e nela apoiar não só sua economia, mas também as relações internacionais, o estado de direito, a justiça e o discurso fastidioso que dissipa “liberdade”, tornaram-se alvos de chacota, fontes de achincalhe para comunistas, socialistas, bolivarianos, etc. Percebei: o ridículo não reside apenas na oratória afetada, mas também na hipocrisia de projetos irrealizáveis, falaciosos.

É chegada a hora, portanto, de revisitarmos o que seja democracia!

sexta-feira, 23 de abril de 2021

O Novo Partido

 

Opto por iniciar o presente documento valendo-me de recurso jornalístico, muito embora eu não o seja. Na qualidade de informador, todavia, não me limitarei a noticiar; desejo criar impacto, polêmica, fazer alarde. E se me perguntardes pelas fontes e se as mesmas são fidedignas, eu vos direi: observação, bom senso, prudência e raciocínio. Quereis fontes mais seguras do que essas?  Dito isso, podemos começar com o famoso Breaking News!  

Eu soube, à boca pequena, que novo partido político está para ser lançado. Melhor, o partido será, em breve, oficializado. Afinal, não é bom para a democracia - somos ou não somos uma democracia séria? (risos) - que partidos políticos mantenham-se na clandestinidade. Em verdade vos digo que o tal partido, mesmo que informalmente, tem prestado excelentes serviços ao legislativo, principalmente àqueles de orientação esquerdista. Não, não! Que digo eu? Tal declaração revela-se como injusta e preconceituosa. Por um momento esqueci-me do já famoso Centrão. Honra seja feita: The Black Shadows prestam serviços a todo e qualquer partido cujo objetivo seja desacreditar e criar embaraços ao governo federal.

Legisladores de certos partidos (na verdade contumazes politiqueiros), quando se veem presas de algum embaraço ou pressentem possíveis dificuldades para perverterem a ordem pública e com isso cometerem alguns desatinos, recebem o aporte incondicional desta eminência parda, pois que além de discretos conselheiros, manifestam grande poder de decisão. Imaginai que, apesar de toda informalidade, eles detêm poder até para declarar a inconstitucionalidade da Constituição. Sim, seus poderes transcendem paredes, muros, fronteiras. A despeito das atitudes ditatoriais, seus ditos falaciosos invocam sordidamente a democracia. Não vos deixeis enganar, pois que invadem esferas de competência, desempenham papeis de investigadores e até brincam de policiais. Nada obstante, vilipendiam a ciência que dizem representar.

Internamente, ou seja, entre os integrantes da facção, pode até, por vezes, surgir alguma discórdia, mas não vos iludais, eles são por demais corporativistas. Diante do exposto, malgrado meus fundamentados receios com a vida pública, pensei até em arriscar-me na política e filiar-me ao referido partido... Ledo engano! Este agrupamento informal é muito reduzido: no máximo 11 (onze) integrantes, e mais uma vez advirto-vos: pasmai! Eles não são eleitos; são indicados pelo chefe do executivo e sabatinados pelo senado (legisladores), donde se pode depreender a origem da troca de favores. Eles chamam isso de “harmonia entre os poderes” ou se preferirdes “governo de coalizão”.    

Certa feita, decidi-me observar de perto uma sessão onde a citada malta se reunira. Confesso-vos ter experimentado um quase medo, afinal, todos de roupa negra (o local mais parecia com a Batcaverna), a falarem uma língua complicada e atolados em imensurável fatuidade. Não, não mais vou lhes aguçar a curiosidade: O dito partido, sobremodo operativo, ainda que em fase de gestação, terá como sigla PSTF, ou seja, Partido Seleto de Togados Fantoches. E a singularidade da sigla não consegue expressar a magnitude da autoridade de seus membros. Detalhe importante: deve-se usar sempre a forma de tratamento destinada a pessoas nobres ou ilustres, pois assim exigem os excelentes a alegar “liturgia” do cargo.

Eu, ao arrogar-me profeta, deixo aqui um alerta sine pecunia as Suas Excelências, seres mergulhados na arrogância, na pretensão, na vaidade: O pavão, muito embora portador de grande beleza, necessita correr grandes distâncias para conseguir voar, e quando o faz, revela-se barulhento e desajeitado. Então, até para se preservar, o pavão evita fazê-lo. A vaidade em si, acaba por estabelecer seus próprios limites. E tem lugar a profecia: Muito em breve, a presumida “casta” será proscrita.  

terça-feira, 20 de abril de 2021

Laicidade Ideológica

 

Em primeiro lugar, entendo que devo discorrer sobre o conceito e/ou definição de laicidade. Pois bem, laicidade é característica do que é laico. Laico, por sua vez, volta-se a algo ou alguém que não pertence ao clero ou fez votos religiosos; não sofre influência ou censura por parte de qualquer agremiação religiosa. Um estado laico, portanto, seria aquele que não contraiu pias obrigações e não sofre controle religioso. O artigo 19 da Constituição Federal de 1988 faz do Brasil um estado laico, pois o país não é governado nem tem suas regras, leis e instituições públicas estabelecidas tendo por base religião ou credo. Contudo, o preâmbulo de nossa Constituição afirma que a mesma foi promulgada sob a proteção de Deus.

Uma lei do estado do Amazonas obrigava escolas e bibliotecas públicas a terem, pelo menos, um exemplar da Bíblia em seus acervos. Pois bem, o STF, em 13 de abril do ano corrente (2021), por unanimidade, declarou anticonstitucional a obrigatoriedade de tal lei. A relatora, ministra Carmem Lúcia, entende que “o Estado não pode exigir uma obra sagrada em detrimento de outras, pois precisa ser neutro e independente em relação a todas as religiões”.  A obrigatoriedade da Bíblia – livro mais lido do mundo, de conteúdo não só religioso mas também histórico – “violaria os princípios da laicidade estatal, liberdade religiosa e isonomia dos cidadãos”.

Então surgem algumas questões: a) livros sobre sexo e ideologia de gêneros apresentados às crianças nas escolas não violariam a liberdade que cada família tem para tratar a temática com seus filhos? b) No ensino da cultura africana, por ventura, entidades, orixás, etc. não são inseridos na temática? Em caso afirmativo, onde ficaria a isonomia dos cidadãos e a liberdade religiosa? Será que o estado, em face dos estudo de outras culturas, perderia sua característica de laicidade? O estudo da mitologia grega ou romana seria proselitismo? Converteria alguém ao paganismo? 

Atualmente, através de projeto de lei, volta à baila uma temática no mínimo perniciosa. Sim, não é a primeira vez que circula pelo legislativo a ideia de colocar limites de tempo a programas religiosos em canais abertos de TV. Por que? Teria o legislativo prerrogativa para interferir em canal televisivo - iniciativa privada - com a retórica de que se trata de uma concessão? Curiosamente, todos os projetos tiveram origem em partidos de orientação esquerdista. O que temem, afinal? A censura, tão combatida por legisladores e jornalistas está de volta? E a liberdade religiosa também protegida constitucionalmente? Seria proselitismo? Não percebo esforço algum em converter pessoas a quaisquer religiões. Será que posso falar em proselitismo da esquerda, haja vista a doutrinação de que os jovens são vítimas nas escolas e universidades?

Em face do exposto, parece-me que o Brasil “aperfeiçoou” o conceito de laicidade. Sim, o aperfeiçoamento deu-se por conta de uma associação desta com a ideologia. Nosso país desenvolveu uma espécie de laicidade ideológica, ou seja, evita, execra, demoniza, criminaliza toda ideia que venha a se colocar contra seus interesses. É bom frisar que os verdadeiros princípios religiosos são avessos a todo e qualquer expediente espúrio, tenha ele origem ou não nas manobras politiqueiras. Dentre a classe política, os mais cínicos chegam ao ponto de defender a ideia absurda e contraditória de um socialismo cristão. Quereis cenas mais absurdas do que Manuela d’Ávila assistindo a uma missa, Haddad a pedir voto aos evangélicos e Lula a visitar e ser recebido no Vaticano?

Não vos permitais enganar! A esquerda tem se empenhado sobremodo em desacreditar e destruir os três pilares da cultura ocidental. 1) O Direito que nos foi legado pela Roma antiga tornou-se objeto de piada, haja vista as derradeiras decisões do nosso STF; 2) a filosofia grega foi tripudiada em virtude de hodiernos “pensadores” terem-na usado como doutrina ideológica; 3) o judaísmo cristão foi anatematizado não só pela indiferença e/ou descrença, mas também pelo tratamento chistoso.    

“O açoite é para o cavalo, o freio para o jumento e a vara para as costas dos insensatos”. Provérbios 26:3

sábado, 17 de abril de 2021

Arte e decadência

 

A ter como premissa que à arte associa-se um objeto, e que este objeto deve revelar-se como lenitivo, fica evidente o imenso desafio encarado pelos verdadeiros artistas na atualidade. Antes mesmo de ser interpelado por alguns de vós acerca do que entendo por verdadeiros artistas, bem como pelo objetivo da arte, adianto-vos. Grandes artistas são aqueles que veem a arte como fim em si mesma e não como meio, seria a arte pela arte; não buscam valer-se da arte para conquistarem glória, reconhecimento, fama, etc. O objeto da arte reside na própria arte; não necessita de intérpretes ou experts para explicá-la. A arte simplesmente deve proporcionar refrigério, conforto, alento aos que dela tornam-se próximos.

O desafio a que me refiro tem por base a mentalidade hodierna: seres humanos parecem ser atraídos pelo indelicado, pelo rude; pessoas, independentemente da classe social ou nível educacional, mostram-se seduzidas pelo banal, pelo vulgar. A humanidade, de um modo geral, aprecia e tem prazer em agressões, sejam elas reais ou representadas. O impactante rouba a cena em qualquer modalidade artística: danças, músicas, canções, poesias, teatro, cinema... Até mesmo os designers e publicidade atuais mostram um quê de incitação. E qual seria a origem de tais representações? Inversão de valores, ou se assim desejarem, uma transvaloração bem ao estilo nietzschiano.   

Em face do cenário apresentado, o desafio que a boa e verdadeira arte encara nos dias de hoje vai muito além de proporcionar alento, alívio; ela deve conseguir demover incautos dessa afiliação nefasta à vulgarização; deve dissuadir os menos esclarecidos acerca do perigo à submissão de valores nocivos. A arte deve, de uma vez por todas, desvendar a vera liberdade, confundida muitas vezes com a catarse psicologista. Se optarmos por um silogismo na arte, a premissa maior seria a beleza que conforta, a premissa menor o banimento dos desvalores e a conclusão seria a pureza e o enobrecimento moral.  

Para corroborar minhas declarações, cito alguém bastante conhecido dos sul-americanos; cito um engenheiro de formação, mas famoso como ator, compositor, escritor e poeta. Refiro-me a Roberto Gómez Bolaños. Durante certa entrevista na sua residência em Cancún, revelou-nos que a construção de personagens ingênuos e com pureza moral é bastante difícil. Acrescentou ainda que as pessoas, em geral, não aplaudem o diálogo inteligente, mas sim o que é grosseiro, o que é rude.  Em defesa da arte, portanto, convoco os veros artistas a não permitirem que a mesma se degenere.

sexta-feira, 16 de abril de 2021

A individuidade ou principium individuationis adversus

 

Talvez por força do hábito – não sei se bom ou mau hábito – venho buscando um porquê para as atitudes humanas. Por exemplo, pergunto-me por que as pessoas discutem, na mor parte das vezes, por coisas insignificantes; há enorme empenho de ambos os lados em provarem suas teorias. Sim, apenas teorias, ou seja, argumentos especulativos, conjecturas, algo de difícil comprovação. E pasmo diante do óbvio, descubro um “eu” que quer subjugar um outro “eu”. Mais estupefato fico ao perceber que, com isso, a verdade está relativizada.

Nada obstante, e não raramente, a porfia assimila a face da discórdia, da mágoa, do rancor, do ódio, do ressentimento. E lá, furtivo e maquiado por termos como autorrespeito, brio, dignidade, subjetividade, etc., percebo não mais um “eu”, mas um ego, ou melhor, uma egolatria sem limites. Neste caso, o “eu” deseja o mal do outro. No entanto, podemos ir ainda um pouco mais adiante, uma situação não só possível mas também provável: é quando o ódio toma matizes de vingança. Nesse caso, o “eu” tem por objetivo a aniquilação do “outro”. Atentai vós outros possíveis leitores! A tal subjetividade, ou melhor, o interesse subjetivo mascara não só o próprio egoísmo, mas igualmente o orgulho, o cinismo, a vaidade, a arrogância, a prepotência, etc.

Então tem início meu questionamento: como uma sociedade que contempla sobremodo o indivíduo, que se empenha em colocar o indivíduo em destaque, em atender aos interesses individuais sobrepondo-o às demandas da sociedade, a disseminar enfim o individualismo, pode falar em respeito ao outro, falar em paz, em amor, em fraternidade, em igualdade, em justiça, em solidariedade? Devo reclamar vossa atenção para o detalhe: individualidade é característica; individualismo é doença. É exatamente disso que se trata. O individualismo abandonou sua condição endêmica; alastrou-se e foi agraciado com leis que o fortalecem.

Bem, e o que fazer? Banir a individualidade para extinguir o individualismo? Afinal, o indivíduo é princípio consciencial; é autoconstrução de um “eu” a partir do mundo, do outro... Evidentemente que não falo em extinção da individualidade, mas tentemos, de início, viver a anular nossas opiniões. Sim, eis o porquê da máxima cristã: “Não julgueis para não serdes julgado”. As palavras de Marco Aurélio podem nos servir de esteio: “Lembra-te: suprimindo a opinião, suprimirás a queixa: ‘Fui ofendido’. Suprima o teu ‘fui ofendido’ e suprimirás o agravo”. Faz-se mister, portanto, o "negar-se a si mesmo" para que o perdão seja possível. Exercitemo-nos na humildade. Determinada oração propõe-nos: “Que eu procure mais consolar que ser consolado, compreender que ser compreendido, amar que ser amado”.

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Verba sapientium


 As palavras de Agur, presentes em Provérbios 30, versículos 18 e 19 declaram: “Há três coisas que são maravilhosas demais para mim; sim, há quatro que não entendo: O caminho da águia no céu, o caminho da cobra na penha, o caminho do navio no meio do mar e o caminho do homem com uma donzela”. A maravilha da narrativa, antes de tudo, estimula nosso imagético. Busquemos, todavia, compreender seu sentido. A que o sábio se propõe? Vejamos! O maravilhar-se é admirar-se, é pasmar diante do aprazível e desconhecido.

Por que maravilhar-se com a águia? A águia é animal muito bem integrado à natureza; ela se vale da força e corrente dos ventos. Se brisas, elas simplesmente flutuam com suavidade; se monções, elas se valem da força destas para voarem alto e se deslocarem em grande velocidade. O importante é que, segundo os sábios, antes de alçar voo, as águias abaixam a cabeça em sinal de humildade. Durante as tempestades, ela não mostra temor; ela abre as asas e alça voo para enfrentar a procela; intuitivamente ela sabe que acima das nuvens carregadas há um sol a brilhar.

Por que maravilhar-se com as serpentes? Cobras são animais de sangue frio, ou seja, a temperatura de seu corpo sofre alterações de acordo com a temperatura ambiente. A cobra rasteja pela penha; o corpo do réptil assimila o calor da pedra. Isso explica seu locomover. Atentai: a aspereza do rastejar na penha em nada lhe é incômodo. Talvez a rudeza do caminho a torne cada vez mais prudente. Cobras se valem e respeitam a natureza; a língua bífida lhe fornece informações necessárias à autopreservação.

Por que maravilhar-se com o navio no mar? Embarcação alguma, muito embora o curso previamente traçado, opõe-se deliberadamente às correntes marinhas, isto é, ao fluxo das águas dos mares, em face da inércia do planeta em seu movimento de rotação, ventos, etc. Navio e navegadores valem-se das correntes e contracorrentes para atingirem maiores velocidades. Marinheiros e barcos integram-se e respeitam as imposições naturais. Viver no mar é, antes de tudo, respeito e admiração ao inopinado, ao intempestivo.

O caminhar do homem com uma donzela, de fato, não causa admiração. Mas o sábio tem dificuldades em compreender porque o homem acompanha a donzela, valendo-se da natureza apenas para a satisfação de seus instintos. Neste caso, a natureza passa a ser um meio e não um fim em si mesma. Muito embora a capacidade de raciocínio, o ser humano revela indiferença ou até mesmo desprezo à natureza. Não vos enganeis, este singular menoscabo acaba por causar muita dor e sofrimento à humanidade.

Implicitamente o sábio está a nos sugerir mais equilíbrio. Sejamos como as águias: integremo-nos à natureza; usemos a nosso favor as “brisas e tempestades” que a vida se nos impõe. Sejamos humildes em face do imponderável. Superemos as procelas do dia-a-dia, certos de que há algo maior por trás dos obstáculos. Tal como as serpentes, busquemos nos adaptar à vida. Afinal, “no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo”; vençamos o mundo! Aproveitemos as inclemências do caminho para tornarmo-nos prudentes. Do mesmo modo que um navio, não nos preocupemos em aportar, não busquemos lugares seguros para fugir dos desafios; tracemos nossa rota valendo-nos das correntes, fluxos e marés que, por certo, far-se-ão abençoadas ao fim da jornada. Caminhemos em companhia de nossa donzela, tornando-a esposa, parceira e companheira no despontar da família.   


domingo, 11 de abril de 2021

Mudança no cardápio

 

* A true story or Based on real facts

 

Longe de quaisquer influências e/ou conspurco hollywoodianos, passo a vos relatar, em breve crônica, acontecimento que, apesar de verídico, dir-se-ia inocente e singularíssimo. Contudo, antes de mais nada, devo esboçar grosso modo o cenário em que o referido evento se desenvolveu. Situemo-nos, portanto, bem no início dos anos cinquentas. Trata-se de jovem casal em recente matrimônio. Poderíamos pensar até em algo como uma Lua de Mel, muito embora os nubentes, em face de suas realidades econômicas, dela tiveram que prescindir.

A casinha alugada era modesta; a mobília mínima, de modo a atender apenas o necessário a ambos os circunstantes. O figurino seria básico, emoldurado, talvez, com alguma peça mais chique em face de possíveis momentos festivos das famílias.  A vidinha, apesar de um ou outro obstáculo e pautar-se somente no parco salário recebido pelo rapaz, seguia seu mal traçado curso. E assim, juntos, driblavam embaraços, minimizavam necessidades, postergavam sonhos. O rádio a palrar sobre o balcão da sala lhes servia de refúgio; vez por outra um bolo ou sorvete para mitigar o lugar comum das refeições diárias. Enfim, o dia-a-dia ditava sua própria característica.

Com o passar do tempo, no entanto, a jovem senhora sentiu-se incomodada; ela queria inovar, abandonar aquele marasmo. Mas, como? Os recursos eram poucos, as possibilidades de alternância mínimas. Só lhe restava o metamorfosear dos alimentos. O marido, graças ao bom Deus, perdoava-lhe os pecadilhos cometidos no âmbito gastronômico. Então lhe veio a ideia, nada original, no tocante à sobremesa. Sim, ela faria o doce a partir de uma lata de leite condensado. Em conversa com certa vizinha, soube que poderia cozinhar o conteúdo da lata junto com o feijão preto ainda não temperado, a visar, evidentemente, economia de gás. E assim o fez: juntos na panela de pressão a lata de leite condensado e meio quilo de feijão sem tempero.

A tarde caiu e ela a esperar ansiosa pelo cozimento dos grãos; queria retirar a lata, esperar seu resfriamento e proporcionar ao marido um novo maná: o excelente doce de leite. Após certo tempo desligou o fogo e com um garfo travou a válvula na posição aberta, de modo a extrair toda pressão da panela. Consultou o relógio: o marido não tardava. Decidiu banhar-se. E para aquela ocasião arrumou-se com maior esmero; loções e outros produtos a auxiliar no diferenciado toalete.

Logo o marido fez-se presente; estava cansado, o dia fora puxado. Ao sentar-se, partilhou o sofá com uma mulher refrescante e perfumada. Os afagos costumeiros, os sorrisos de lado a lado, a carícia mais ousada... Ela falava em uma surpresa e o aconselhava a um bom banho. Pois bem, enquanto ele empenhava-se na higiene, em particular a alguma ablução, a mulher voltara à cozinha. Abriu enfim a panela e deixou escapar um gritinho rouco. A lata, com temperatura e pressão elevadas no recipiente durante o cozimento, rompera-se e permitira o vazamento do conteúdo.

Não pretendo ocupar vosso precioso tempo em narrativas que venham a discorrer sobre o óbvio: crises existenciais, ameaças de depressão, desculpas, acusações, agressões ou algo que se lhes assemelhe, afinal trata-se de um casamento, e vós conheceis parte do desfecho. Todavia, fica aqui registrado que, pelo menos por uma semana, o casal - também não interessa se a contragosto - teve que comer feijão preto temperado apenas com leite condensado. Sim, e nunca mais arriscou-se uma mudança no cardápio.    

sexta-feira, 9 de abril de 2021

Iuris Atheismus (Lei do ateísmo)


Quando pensava já ter visto de tudo, pude testemunhar mais um dos inumeráveis desmandos do STF. Imaginai que Suas Excelências, ainda ontem, talvez porque a toga negra assemelhe-se a trajes eclesiásticos, decidiram brincar de párocos e discorrerem sobre teologia, ciência que, decididamente desconhecem. E o mais curioso: sequer preocuparam-se em demonstrar um mínimo de “notável saber teológico”. A imensa vaidade que vitima nossos preclaros ministros é símile ao desejo, pois que também desconhece a saciedade. O desejo de que falo em nada se parece com a vontade de saber, mas sim com o querer dominar, por limites, cercear liberdades. E vos pergunto: Mas não se trata de uma corte constitucional? E onde fica a constituição?

Há muito que o aclamado Superior Tribunal Federal desvencilhou-se de qualquer compromisso constitucional. Pode-se notar, e de modo patente, o envolvimento político da corte, pois em sua decisão entendeu que as assembleias religiosas - não os bancos, ônibus, trens, metrôs lotados, etc. - colaboram na disseminação do vírus pandêmico, independente de seguirem as orientações sanitárias. Este burlesco e caótico entremetimento na seara alheia faz com que a corte constitucional abandone seus saberes jurídicos (bem limitados, cá entre nós) e adentre à esfera das ciências físicas, das ciências exatas, das ciências sociais, arte e - a exemplo da sessão realizada ontem - ciências teológicas. Alguns dos notáveis conseguiram expelir (seria este o termo correto?) os resíduos protocolares de seus excrementos mentais e fantasiaram-se de sacrílegos, de ateus, agnósticos. Se bem que... eu diria que nossa corte vergou-se a um tipo inusitado de idolatria: submeteram-se a Narciso: o deus da vaidade. Consequentemente praticaram uma também singular heresia: apostasia jurídica! 

O curioso - e por quê não pândego? - em tudo isso é que os partidos de esquerda protocolaram um pedido de impeachment do Presidente da República, pois este teria cometido crime de responsabilidade ao tentar politizar as forças armadas. Nobody deserves. Ninguém merece. Mas enfim, eis a pretendida democracia!

terça-feira, 6 de abril de 2021

Contra naturam

 

O inverno findara; seguiu-se o desabrochar das flores na estação primaveril. Lindo! Pássaros e insetos em seus infindáveis e aleatórios passeios só fazem polinizar, semear. O que é isto? Natureza. Depois da flor, o fruto. Sabeis vós quanto de energia um vegetal gasta para produzir seus frutos? Por que? A natureza se empenha em autopreservar-se. E o sexo entre animais? O sexo tem que ser prazeroso para que se cumpra uma exigência da natureza. Para que, entre seres humanos, os olhares, as sensações, os sentimentos, a libido, a produção de hormônios? Para o sexo. Por que? É mister para que a natureza se realize, se preserve, permaneça em si mesma; é o conatus de Spinoza. O organismo animal, da fêmea mais especificamente, altera-se, reacomoda-se, readapta-se para gerar um novo ser, seu fruto. Para que? Para que a espécie se eternize. Conseguis perceber? A natureza não se preocupa com o indivíduo, mas sim com a espécie. As realizações individuais, portanto, devem estar acordes com os interesses da espécie. Logo, a questão sexual é refém de uma estrutura vital que se vincula tão somente à natureza, e, ipso facto, às ciências naturais.  

Em se analisando outro aspecto, é perceptível a constância com que os fenômenos se repetem na natureza. Sim, há como que uma “norma” a ser seguida inexoravelmente pelo conjunto de forças que obram no Universo. E nós, meros coadjuvantes neste cenário, já temos como certos a repetição dos fenômenos naturais. Por exemplo: há como que uma convicção, fruto de observação das ciências naturais, no que tange à alternância das marés em intervalos de aproximadamente seis horas. Sim, no tocante à natureza, os padrões repetitivos criam o que chamamos de normalidade. Se porventura, devido a uma circunstância, conhecida ou não, detectada ou não, a primavera não suceder o inverno, nós declaramos uma anormalidade. Percebei: em termos de natureza, nós não criamos circunstâncias para forjar o que por si mesmo se revela como normal. Uma normalidade criada, dar-se-ia, possivelmente, na esfera das ciências sociais, isso quando levado em conta os valores supedâneos de qualquer sociedade.

Pelo exposto, podemos inferir que sexualidade não é temática para ser discutida por ciência social, pois pode-se incorrer no risco de grave impostura intelectual. E então vos pergunto: Ainda pretendeis entender a homossexualidade como algo normal? Ela se volta contra a natureza. Por mais que as leis defendam os direitos dos homossexuais, por mais que as pessoas os respeitem, por mais que estejam inseridos na sociedade, eles sempre sentirão necessidade de reconhecimento e aceitação. Eles não querem ser respeitados como pessoas ou como cidadãos; eles não querem ser tratados de modo igualitário; eles querem tratamento diferenciado, pois querem ser respeitados como homossexuais. Por que? O problema é que eles não aceitam a si mesmos, pois a natureza - e inconscientemente eles sabem disso - não está sendo realizada. A prática da homossexualidade atende unicamente a expectativa, aos anseios do indivíduo, nunca ao anelo da espécie.