Tornou-se trivial em nosso cotidiano a
prática nada original de regravar canções antigas, de fazer releituras de sucessos
cinematográficos, principalmente no que tange aos heróis e aos clássicos da
literatura, típicos das gerações baby
boomer e X. Não obstante, o que reclama nossa atenção é que a prática de
regravar, reler etc., alia-se a outra igualmente inconspícua: nada criar, e o
que porventura é criado - e aqui me permito generalizar, infelizmente - carece
de sentido, de bom senso, de bom gosto. Surgem sim, situações cômicas e/ou
estapafúrdias que culminam em desfechos igualmente cômicos e/ou estapafúrdios,
mascarados, evidentemente, pelo argumento da subjetividade.
A prática das releituras não pode reclamar a
si criatividade ou genialidade, pois se filia a um grande erro conceitual. A
releitura, principalmente onde há distorções no caráter dos personagens,
limita-se a uma visão estritamente particularizada e distante de todo e
qualquer aporte. A criação está diretamente relacionada às ideias originais, a
tirar do nada, ao ineditismo, a inventar, idear, criar no pensamento.
Releituras, em geral, se tornam reféns da carga valorativa do transcritor,
mascarando, assim, a originalidade de um texto ou de um personagem.
Mas, por que tal prática? Onde a criatividade
das gerações Y e Z? Estamos vivendo uma crise na criatividade ou crise da
criatividade? Será que a capacidade criativa está sendo simplesmente amordaçada?
Poder-se-ia falar em manifestação de uma contracultura, mas o que é
contracultura senão revolta contra atividades artísticas dominantes? Ora,
reedições, releituras, regravações não são ações típicas de um movimento contra
cultural; nem mesmo se poderia falar em aculturação. Na verdade, o que se vê é
um reacionarismo cultural.
Bem, o argumento de que a arte é a expressão
maior da liberdade seria conveniente. Mas que tipo de liberdade artística leva novas
gerações a buscaram abrigo em gerações passadas? Poder-se-ia ainda falar na
arte como catarse, mas como entendê-la? Catarse se refere à purificação de
sentimentos, à liberação de emoções, à exteriorização da sensibilidade.
Pergunta-se: estariam as gerações Y e Z privadas de suficientes emoções,
sentimentos, sensibilidade? Ou será que atingimos o limiar da sensibilidade ou
insensibilidade humanas? O que pode gerar a insensibilidade? O que faz com que os
novos seres sejam privados de emoções? O que estagna os sentimentos? Seria um
excesso de racionalismo? Seria o individualismo exacerbado? Seria a expansão
desmedida de uma tecnologia que promove uma acomodação sistêmica? Seria a
fartura do imagético que leva a um abandono do pensar? Seria a gama exorbitante
de informações que condiciona e/ou reprime de modo nefasto a busca pelo
inédito? Porventura, não seria a intervenção de consequências negativas
advindas de gerações passadas? Ou, quem sabe, talvez, as consequências de uma
ideologia cultural nefasta?
De fato, as novas gerações lutam por um criar
artístico, querem exibir seus novos ideais, querem registrar suas marcas, querem
ostentar uma chancela, mas o “como” não lhes foi concedido. Talvez estejamos
vivendo a soma de todos os erros.
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