“Mostre-me
um herói e eu escreverei uma tragédia”.
F.
Scott Fitzgerald
Bem,
como toda consultoria e/ou aconselhamento, faz-se necessário o emprego de um
método rigoroso, método este que, para se lograr resultado, cada passo deve ser
seguido à risca.
1º
- Encontra uma categoria que não seja bem acolhida pelos governantes, ou
melhor, uma classe de trabalhadores que padeça de alguma indiferença do Estado.
2º
- Busca nela se infiltrar, indiferente se tens ou não interesse na mesma; se
sabes ou não exercer tal função. Isso não é essencial; o importante é nela se
infiltrar no intuito de realizar teu sonho de liderança carismática.
3º
- Feito isso, cria uma base sólida de apoio. Como? Simples: começa por fazer daquela
classe uma vítima. Atenção: É muito importante o mecanismo de vitimização da
classe, pois que esta é a base do proselitismo que permitirá uma melhor
cooptação. Não te preocupes em nada com a dita classe, apenas demonstra com ela
se importar. Nada de preocupação com a ética.
4º
- Quando a classe estiver convencida da sua condição de vítima, dá início ao
discurso de cooptação. Como deve ser esse discurso? Simples: Mostra-te irritado
e diz toda tua indignação pelo modo como a classe tem sido tratada até então. Usa
uma linguagem vulgar, até mesmo chula. Não te esqueças de que a linguagem deve
se aproximar ao máximo da linguagem da classe que dizes defender. Cria palavras
de ordem; inventa chavões que sintetizem teu pensamento. Aqueles que se sentem
vítimas adoram seguir chavões; parte do princípio de que eles não pensam, mas
tu pensas por eles. Busca ler o Manifesto Comunista, de preferência em
quadrinhos, pois a edição impressa é algo muito difícil para ti. O marxismo é a
melhor base para pronunciamentos afetados e o melhor consolo para aqueles que
foram taxados de vítimas. Assim, a classe em questão, vai se sentir bem mesmo quando
se veja como um fracasso. Não te preocupes com pensamentos rebuscados, afinal
és um semianalfabeto e oportunista que busca apenas reconhecimento e destaque.
Tu só queres “se dar bem”, e nada mais. Portanto, não poupes bravatas e
fanfarronadas. Sim, coloca-te frontalmente contra a classe média, mesmo que a
classe média seja o teu objetivo sonhado. É bom lembrar que até filósofos
profissionais declaram odiar a classe média. Afinal, se pertencesses à classe A
ou às oligarquias, não terias necessidade ou mesmo vontade de se tornar líder
classista.
5º
- Agora já podes fundar um sindicato. Sim, promete melhoras; promete lutar pelo
progresso da classe que te propões defender. Grita, esbraveja, exalta-te. Por
certo tu serás eleito presidente da tal classe trabalhadora e não mais precisarás
ficar batendo ponto, pegando no pesado, aturando gerentes, chefes, cumprindo
metas, etc. A partir daí já podes começar a desfrutar da tua condição de
destaque, pois que vais viver das contribuições dos sindicalizados. Nesta
condição, não temas fazer acordos por debaixo dos panos. Negocia sempre visando
teu único bem-estar. Tem sempre dois discursos prontos: um para os
trabalhadores que dizes representar e outro para as negociações com os
empresários. Não esqueças que teu objetivo é a realização pessoal; mente nas
promessas aos associados e sê dissoluto nos acordos com os patrões. Não é
preciso coerência!
6º
- Bem, podes parar por aqui. Se atendeste rigorosamente às determinações deste
manual, certamente já és um líder carismático. Mas se quiseres seguir adiante,
pois o espírito capitalista, a vaidade e a ganância não conhecem limites,
adentra a política. Escolhe um partido pequeno, porque neste tens condição de tornar-te
também um dos dirigentes; partidos grandes já têm suas “velhas raposas”. Mas o
ideal é que fundes teu próprio partido político, assim continuarias a dar as
cartas. Age partidariamente do mesmo modo como vinhas agindo sindicalmente:
visa apenas teus interesses. Nada de ideologias; tua ideologia é o lucro. De
início, confirma apoio aos poderosos, mas não esqueças de que buscas ser tão
poderoso quanto eles. Portanto, esquece qualquer escrúpulo, qualquer princípio
moral ou algo que o valha. Do mesmo jeito que tratavas teus antigos
sindicalizados, deves tratar teus eleitores. Não deixes de lado os dois tipos
de discurso. Todavia, precisas do apoio de alguns intelectuais. Sim, os
intelectuais vivem para dar apoio a causas estúpidas; intelectuais, em geral,
são depressivos e se alinham aos discursos afetados por conta de suas más
consciências. Sugestão: bajula-os! Eles adoram isso.
7º
- Agora já podes desfrutar do poder. Não, o poder não modifica ninguém, apenas revela
as distorções de caráter. Neste caso, continua obstinado a tornar-te um líder
carismático; o poder pode ser de grande ajuda. Teus discursos devem manter a
mesma tônica, o mesmo conteúdo: promessas, agressões, fanfarronadas, bravatas,
termos chulos, ameaças. Não interessa se teus discursos destoam de tuas ações;
como já foi dito, não há necessidade de coerência. Se for preciso, chora. O
povo adora discursos exaltados e apaixonados; o povo é apenas massa de manobra.
O bom líder faz o que quer das massas.
8º
- Sabe fazer concessões, aprende a driblar, a costurar acordos. Exige total
submissão de teus comandados e correligionários. Usa tua influência e beneficia
amigos e familiares; principalmente os familiares. Negocia e aceita propina;
suborna, compra, corrompe, indiferentemente se empresários, políticos ou
representantes do judiciário. Aproveita as licitações públicas e faz acordos de
superfaturamento. E lembra-te: bens móveis e imóveis em nome de “laranjas”;
dinheiro só em contas numeradas em algum paraíso fiscal no exterior. Nada de
moralidade, nada de probidade. Na política, nem os religiosos usam de
probidade. E mais uma vez: nada de princípios éticos. O discurso ético só tem
serventia quando fores acusar um de teus desafetos. Recebe presentes, agrados,
etc., mas lembra-te: nada em teu nome; nada de documentos; nada de testemunhas.
Não te deixes gravar, filmar ou algo parecido. Outra coisa importante: Em teus
discursos, não deixes de sempre se referir àqueles primeiros companheiros do sindicato;
continua fazendo-os vítimas de um sistema injusto e excludente. Desse modo deles
receberás eterno respeito e admiração; serás venerado e considerado alguém
acima de qualquer suspeita.
9º
- Coisa importante quando em cargos eletivos: nomeia indiretamente amigos e
pessoas de teu círculo, ou seja, através de teus correligionários, mas não
deixes de mantê-los nas rédeas. Não, não se deve travar luta com inimigos
políticos: acerca-te deles e os tenha por perto. Transforma-os em teus
colaboradores quando descobrir neles qualquer desvio; mantenha-os sob controle.
Distribui cargos, nomeia de preferência aqueles de quem conheces a banda podre.
Sim, continua agradando os “intelectuais”. Como? Faz uso dos recursos do
governo que financia projetos culturais para comprar-lhes o apoio. Não
obstante, teus discursos devem primar pela preocupação com Direitos Humanos,
com as minorias, com a pobreza, com os movimentos sociais, com o meio ambiente,
etc. Teus projetos devem albergar veladamente o princípio do populismo, do
assistencialismo. Diz sempre aquilo que as pessoas desejam ouvir; esse é o bom
discurso. Continuarás a arrebanhar respeito, admiração e a fazer proselitismo.
Serás um herói.
10º
- Assim conseguirás alcançar teu objetivo. Não, nada de arrependimentos, enfim,
és apenas mais um oportunista que se deu bem na vida. Farreia à vontade, viaja
para lá e para cá pelo mundo com o dinheiro do contribuinte. Veste boas roupas
de grife, entope-te com as melhores iguarias, embebeda-te com os melhores
uísques, conhaques e vinhos, inala o melhor dos fumos cubanos ou da República
Dominicana. Mazel Tov! Se, porventura, surgir algum contratempo, isto é, alguém
que te denuncie, apenas nega tudo. Diz que não sabe de nada; diz que é armação,
que estão querendo te incriminar; põe a culpa na oposição, na elite, nas
oligarquias, na burguesia. Fala em perseguição política. Mune-te de advogados
tão oportunistas quanto tu. Está tranquilo, afinal, corrupção não se prova ou
comprova.
Não
esqueças, contudo, que existem pessoas, assim como eu, que conhecem todo esse
processo hipócrita e covarde. Não pretendas convencer-nos da tua virtude; não
empregues conosco tua desfaçatez; não busques mostrar-te como alguém de caráter
exemplar. Não tentes passar-nos uma imagem de altruísmo ou de honradez. Sabemos
da tua notoriedade, todavia, já por alguma experiência, sabemos também que és,
dentre tantos, apenas mais um canalha que pretende se eternizar no poder
travestido de fabricado carisma.
Não sei porque um nome de um certo presidiário me veio a cabeça!!!
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