domingo, 4 de novembro de 2018

10 passos para se tornar um líder carismático



“Mostre-me um herói e eu escreverei uma tragédia”.
F. Scott Fitzgerald

Bem, como toda consultoria e/ou aconselhamento, faz-se necessário o emprego de um método rigoroso, método este que, para se lograr resultado, cada passo deve ser seguido à risca.
1º - Encontra uma categoria que não seja bem acolhida pelos governantes, ou melhor, uma classe de trabalhadores que padeça de alguma indiferença do Estado.
2º - Busca nela se infiltrar, indiferente se tens ou não interesse na mesma; se sabes ou não exercer tal função. Isso não é essencial; o importante é nela se infiltrar no intuito de realizar teu sonho de liderança carismática.
3º - Feito isso, cria uma base sólida de apoio. Como? Simples: começa por fazer daquela classe uma vítima. Atenção: É muito importante o mecanismo de vitimização da classe, pois que esta é a base do proselitismo que permitirá uma melhor cooptação. Não te preocupes em nada com a dita classe, apenas demonstra com ela se importar. Nada de preocupação com a ética.
4º - Quando a classe estiver convencida da sua condição de vítima, dá início ao discurso de cooptação. Como deve ser esse discurso? Simples: Mostra-te irritado e diz toda tua indignação pelo modo como a classe tem sido tratada até então. Usa uma linguagem vulgar, até mesmo chula. Não te esqueças de que a linguagem deve se aproximar ao máximo da linguagem da classe que dizes defender. Cria palavras de ordem; inventa chavões que sintetizem teu pensamento. Aqueles que se sentem vítimas adoram seguir chavões; parte do princípio de que eles não pensam, mas tu pensas por eles. Busca ler o Manifesto Comunista, de preferência em quadrinhos, pois a edição impressa é algo muito difícil para ti. O marxismo é a melhor base para pronunciamentos afetados e o melhor consolo para aqueles que foram taxados de vítimas. Assim, a classe em questão, vai se sentir bem mesmo quando se veja como um fracasso. Não te preocupes com pensamentos rebuscados, afinal és um semianalfabeto e oportunista que busca apenas reconhecimento e destaque. Tu só queres “se dar bem”, e nada mais. Portanto, não poupes bravatas e fanfarronadas. Sim, coloca-te frontalmente contra a classe média, mesmo que a classe média seja o teu objetivo sonhado. É bom lembrar que até filósofos profissionais declaram odiar a classe média. Afinal, se pertencesses à classe A ou às oligarquias, não terias necessidade ou mesmo vontade de se tornar líder classista. 
5º - Agora já podes fundar um sindicato. Sim, promete melhoras; promete lutar pelo progresso da classe que te propões defender. Grita, esbraveja, exalta-te. Por certo tu serás eleito presidente da tal classe trabalhadora e não mais precisarás ficar batendo ponto, pegando no pesado, aturando gerentes, chefes, cumprindo metas, etc. A partir daí já podes começar a desfrutar da tua condição de destaque, pois que vais viver das contribuições dos sindicalizados. Nesta condição, não temas fazer acordos por debaixo dos panos. Negocia sempre visando teu único bem-estar. Tem sempre dois discursos prontos: um para os trabalhadores que dizes representar e outro para as negociações com os empresários. Não esqueças que teu objetivo é a realização pessoal; mente nas promessas aos associados e sê dissoluto nos acordos com os patrões. Não é preciso coerência!
6º - Bem, podes parar por aqui. Se atendeste rigorosamente às determinações deste manual, certamente já és um líder carismático. Mas se quiseres seguir adiante, pois o espírito capitalista, a vaidade e a ganância não conhecem limites, adentra a política. Escolhe um partido pequeno, porque neste tens condição de tornar-te também um dos dirigentes; partidos grandes já têm suas “velhas raposas”. Mas o ideal é que fundes teu próprio partido político, assim continuarias a dar as cartas. Age partidariamente do mesmo modo como vinhas agindo sindicalmente: visa apenas teus interesses. Nada de ideologias; tua ideologia é o lucro. De início, confirma apoio aos poderosos, mas não esqueças de que buscas ser tão poderoso quanto eles. Portanto, esquece qualquer escrúpulo, qualquer princípio moral ou algo que o valha. Do mesmo jeito que tratavas teus antigos sindicalizados, deves tratar teus eleitores. Não deixes de lado os dois tipos de discurso. Todavia, precisas do apoio de alguns intelectuais. Sim, os intelectuais vivem para dar apoio a causas estúpidas; intelectuais, em geral, são depressivos e se alinham aos discursos afetados por conta de suas más consciências. Sugestão: bajula-os! Eles adoram isso.
7º - Agora já podes desfrutar do poder. Não, o poder não modifica ninguém, apenas revela as distorções de caráter. Neste caso, continua obstinado a tornar-te um líder carismático; o poder pode ser de grande ajuda. Teus discursos devem manter a mesma tônica, o mesmo conteúdo: promessas, agressões, fanfarronadas, bravatas, termos chulos, ameaças. Não interessa se teus discursos destoam de tuas ações; como já foi dito, não há necessidade de coerência. Se for preciso, chora. O povo adora discursos exaltados e apaixonados; o povo é apenas massa de manobra. O bom líder faz o que quer das massas.
8º - Sabe fazer concessões, aprende a driblar, a costurar acordos. Exige total submissão de teus comandados e correligionários. Usa tua influência e beneficia amigos e familiares; principalmente os familiares. Negocia e aceita propina; suborna, compra, corrompe, indiferentemente se empresários, políticos ou representantes do judiciário. Aproveita as licitações públicas e faz acordos de superfaturamento. E lembra-te: bens móveis e imóveis em nome de “laranjas”; dinheiro só em contas numeradas em algum paraíso fiscal no exterior. Nada de moralidade, nada de probidade. Na política, nem os religiosos usam de probidade. E mais uma vez: nada de princípios éticos. O discurso ético só tem serventia quando fores acusar um de teus desafetos. Recebe presentes, agrados, etc., mas lembra-te: nada em teu nome; nada de documentos; nada de testemunhas. Não te deixes gravar, filmar ou algo parecido. Outra coisa importante: Em teus discursos, não deixes de sempre se referir àqueles primeiros companheiros do sindicato; continua fazendo-os vítimas de um sistema injusto e excludente. Desse modo deles receberás eterno respeito e admiração; serás venerado e considerado alguém acima de qualquer suspeita.
9º - Coisa importante quando em cargos eletivos: nomeia indiretamente amigos e pessoas de teu círculo, ou seja, através de teus correligionários, mas não deixes de mantê-los nas rédeas. Não, não se deve travar luta com inimigos políticos: acerca-te deles e os tenha por perto. Transforma-os em teus colaboradores quando descobrir neles qualquer desvio; mantenha-os sob controle. Distribui cargos, nomeia de preferência aqueles de quem conheces a banda podre. Sim, continua agradando os “intelectuais”. Como? Faz uso dos recursos do governo que financia projetos culturais para comprar-lhes o apoio. Não obstante, teus discursos devem primar pela preocupação com Direitos Humanos, com as minorias, com a pobreza, com os movimentos sociais, com o meio ambiente, etc. Teus projetos devem albergar veladamente o princípio do populismo, do assistencialismo. Diz sempre aquilo que as pessoas desejam ouvir; esse é o bom discurso. Continuarás a arrebanhar respeito, admiração e a fazer proselitismo. Serás um herói.  
10º - Assim conseguirás alcançar teu objetivo. Não, nada de arrependimentos, enfim, és apenas mais um oportunista que se deu bem na vida. Farreia à vontade, viaja para lá e para cá pelo mundo com o dinheiro do contribuinte. Veste boas roupas de grife, entope-te com as melhores iguarias, embebeda-te com os melhores uísques, conhaques e vinhos, inala o melhor dos fumos cubanos ou da República Dominicana. Mazel Tov! Se, porventura, surgir algum contratempo, isto é, alguém que te denuncie, apenas nega tudo. Diz que não sabe de nada; diz que é armação, que estão querendo te incriminar; põe a culpa na oposição, na elite, nas oligarquias, na burguesia. Fala em perseguição política. Mune-te de advogados tão oportunistas quanto tu. Está tranquilo, afinal, corrupção não se prova ou comprova.
Não esqueças, contudo, que existem pessoas, assim como eu, que conhecem todo esse processo hipócrita e covarde. Não pretendas convencer-nos da tua virtude; não empregues conosco tua desfaçatez; não busques mostrar-te como alguém de caráter exemplar. Não tentes passar-nos uma imagem de altruísmo ou de honradez. Sabemos da tua notoriedade, todavia, já por alguma experiência, sabemos também que és, dentre tantos, apenas mais um canalha que pretende se eternizar no poder travestido de fabricado carisma. 

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